quinta-feira, 21 de outubro de 2021

pensamento dança - Igor Fagundes


educação pela dança

 

Uma educação pela dança por lições

para aprender do corpo, garimpá-lo

até flagar sua fala mineral

quando a verdade, líquida, evapora

e leva ao céu as casas nele suspendidas

e quando a pedra preciosa, cabralina

é musical na escuta de uma dúbia lírica

de dentro para fora se entornando etílica

em meio as notas de uma orquestra visceral:

lições dos órgãos, dos violões dos ossos

que afinam nos tendões suas bambas cordas

abrindo  a carne em cálice e corola

houvesse pólen rutilando ritmos

 

Outra educação pela dança: no sertão

que é o mundo inteiro atravessando o corpo

ao infinito e desde o nada, entre veredas

de fora para dentro, em busca de uma Ítaca

na seca subjetiva, cujo mar em fosso

esconde-se onde o coro das sereias se ouve

em cada fêmur, nos quadríceps, no eclipse

do pé trazido ao ombro e em nossos heterônimos

fingindo a dor deveras de vestir Pessoas:

se no caminho de uma pedra tem Drummond

no mineral da artéria pulsa o claro enigma

de um coração que dança arranjos para um livro

das ignorãnças sobre o humano e seu abismo

 

biografia

 

Por sete anos, eu calei meu verso

para espremer poesia de outras faces:

fazer brotar, talvez, na ciência a arte

foi sempre meu teórico projeto

 

O caos na víscera do artista escapa

ao tratadístico das teses gélidas:

o excesso de ordem cerra em cemitério

o corpo-terremoto da palavra

 

Fui aos filósofos sangrar as regras:

adeus  às antonímias de Descartes

depois às prescrições de toda a Estética

Platão jamais deixou de ser um vate

 

Para educar ao não saber quem sabe

me quis um poeta solto ao magistério:

sobre as carteiras refutei o estático

conforme o transe de um docente elétrico

 

Me possuí, que até pensei ser médium

nas aulas quase rio em rito iniciático

de um cérebro cientista ao céu sagrado:

restou-me um doutorado nesta fé

 

Se me cumpri no axé da encruzilhada

entre os saberes, deslizando afetos

cruzou-me a dança como um novo método

de deslizar o que se diz em verbo

 

Agora escrevo-danço e coreografo

as letras bêbadas de bailes, gestos

para mover o poema como ensaio

em culto à carne do alfabeto

 

Igor Fagundes

 

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https://www.youtube.com/watch?v=uI7vLJ9iQp8

 

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https://www.youtube.com/watch?v=HSVaEgGDumg&t=34s



Nascido em 5 de dezembro de 1981 no Rio de Janeiro, Igor Fagundes é poeta, ensaísta, crítico literário, ator, jornalista, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), onde leciona Filosofia, Estética, História e Crítica da Dança, e doutor em Poética pela mesma universidade, com a tese que deu origem a este livro. Além de Poética na incorporação, assina a autoria de outras sete obras, das quais quatro são de poesia e três do gênero ensaio. Publicou: Transversais (2000); Sete mil tijolos e uma parede inacabada (2004); Por uma gênese do horizonte (2006/Prêmio Literário Livraria Asabeça); Os poetas estão vivos – pensamento poético e poesia brasileira no século XXI (2008/ Prêmio Literário Cidade de Manaus: Melhor Ensaio de Literatura); Zero ponto zero (2010); 33 motivos para um crítico amar a poesia hoje (2011); e Permanecer silêncio (2011). Como coorganizador e coautor, assina Convite ao pensar (2014) e O educar poético (2014). É também o organizador da antologia poética O galope de Ulisses (2014), de José Inácio Vieira de Melo; e coautor de outros quase 30 livros, dentre os quais Roteiro da poesia brasileira – anos 2000 (organização de Marco Lucchesi); Chico Buarque – o poeta da mulher, dos desvalidos e dos perseguidos (organização de Rinaldo Fernandes); Pensamento poético: à escuta das questões da arte (organização de Antônio Máximo Ferraz); Caminhos da violência em busca da visão compartilhada, Violência simbólica e estratégias de dominação e Quem conta um conto: estudos sobre contistas femininas estreantes nas décadas de 90 e 2000 (todos organizados por Helena Parente Cunha); e Secchin: uma vida em Letras (coorganização de Godofredo de Oliveira Neto e Maria Lúcia Guimarães de Faria). Possui cerca de 60 premiações em concursos e festivais literários. No teatro, campo em que também obteve prêmios, atuou em 14 espetáculos, escreveu três e dirigiu dois. É fundador e atualmente o coordenador do NuNada – Núcleo Interdisciplinar de Filosofia, Poética e Corporeidade na UFRJ e da Rede Poética – Núcleo Interinstitucional de Pesquisas em Arte e Filosofia. Em 2020 prefaciou o livro O Poeta Enquanto Coisa, de Artur Gomes, lançado pela Editora Penalux.

Com Os Dentes Cravados Na Memória

Artur Gomes entrevista Igor Fagundes http://arturgumes.blogspot.com/2020/05/igor-fagundes-entrevistas.html




Artur Gomes

FULINAIMAGEM

www.fulinaimagens.blogspot.com

 

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