A Geografia Poética de Artur Gomes, em Música,
Prosa e Verso
ou
A Arte da Palavra em Movimento
Por Cristiane Grando*
“todo poema tem dois gomes
toda faca tem dois gumes”
Artur Gomes
“A poesia é palavra que não fere o silêncio.”
Jorge Berchet
É possível encontrar, na poesia de Artur Gomes (Cacomanga-RJ, 1948), uma
série de referências culturais, uma espécie de mapa, uma geografia poética.
Seus versos são visitados por diversos artistas e intelectuais, vivos e
eternos, da arte brasileira e universal, como os músicos Caetano Veloso, Miles
Davis, Janis Joplin, e John Lennon, os cineastas Godard, Truffaut, Fellini e
Glauber Rocha, filósofos, dramaturgos, artistas plásticos, os poetas-amigos
Dalila Teles Veras, Luíza Buarque e Zhô Bertholini, além de uma infinidade de
escritores e poetas: Hilda Hilst, Paulo Leminski, Ferreira Gullar, Fernando
Pessoa, Drummond, Lorca, entre outros, e especialmente seus mestres – os
Andrades, Mário e Oswald e Guimarães Rosa... Macunaíma, Serafim Ponte Grande e
Sagarana, são referências constantes na obra de Artur Gomes.
Num diálogo intenso com a tradição
literária, Macunaíma transforma-se em Fulinaíma, e, acrescida da obra do mestre
Guima, metamorfosea-se em SagaraNAgens
Fulinaímicas, (livro e CD ainda inéditos) poesia-música... e teatro, para
os que têm o privilégio de assistir aos shows de Artur Gomes, declamando pelas ruas, bares, palcos... pela vida. Em
sua inquietude, Gomes, impregna o mundo com o som de poemas no cotidiano,
quando os torna existência em sua voz. O valor deste trabalho poético e musical
ganha maior intensidade quando inserido no contexto da sociedade contemporânea,
no qual a poesia quase não tem espaço nem estudo.
A poesia de Artur Gomes fere sem ferir. Num universo de navalhas, sexo, cio,
náuseas, estrumes, sua poesia tem dois gumes: um, marcado pela tradição dos
poetas malditos, retomando Baudelaire, Rimbaud e Mallarmé em inúmeros poemas;
outro pela musicalidade, arma com a qual assalta/assusta o leitor desprevenido.
Em lances de versos metalingüísticas, o próprio poeta define o fazer poético: “pense sinfonia em rimas raras”.
Para ler Artur Gomes, devemos sempre estar atentos aos jogos de palavras, à
riqueza do trabalho sonoro e rítmico, à musicalidade, à inquietude de seus conceitos,
à plurissignificação, à multiplicidade das formas que as palavras assumem no
espaço da folha em branco, às maiúsculas e minúsculas usadas de forma nada
convencional, à criação de neologismos e novas expressões, como drummundo,
sabe/sabre, fogo de palha/fogo & palha, bola de gude/gosma de grude, boca
do estômago/bala no estômago. Um exemplo de trabalho formal e inovador e
representado no poema “ Dia D”, cujas estrofes iniciam-se por uma vírgula.
A cultura brasileira ganha valor e
significado quando é convocada à sua festa criativa uma grande quantidade de
elementos indígenas e africanos, relegados muitas vezes pela sociedade
brasileira. Da mesma forma, estilos musicais variados, associados à vanguarda
da música contemporânea, também são convocados a esta festa de livros e CDs de Artur Gomes que pode ser conferida
ouvindo o CD Fulinaíma Sax Blues Poesia,
onde desfia com os seus parceiros Luiz Ribeiro, Naiman, Dalton Freire e Reubes
Pess a sua “Marca Registrada”.
A palavra poética é uma ponte, uma
celebração da liberdade pela qual as pessoas podem ou devem ao menos tentar
cruzar, para se salvarem ou para gritarem contra as injustiças sociais e abusos
que o império comete em seus extra-muros.
A arte que assume Artur Gomes em seus versos e em sua
vida é a arte da palavra em movimento. Sendo ator, gestor e produtor cultural, Artur caminha por diversas vertentes
artísticas. Assim como o mímico Jiddu Saldanha, Artur Gomes sabe “arrancar
do gesto/ a palavra chave/ da palavra a imagem xis/ tudo por um risco/ tudo por
um triz”.
Agradecimentos ao poeta Leo Lobos,
pela leitura da obra de Artur Gomes
e pelo diálogo, sugestões e comentários tecidos durante a elaboração do texto.
Cristiane Grando
Escritora, fotógrafa e professora
Doutora em Teoria Literária e
Literatura Comparada – Universidade de São Paulo (USP). Laureada
UNESCO-ASCHBERG de Literatura 2002-2003
Artur GomesFulinaimagens
www.fulinaimagens.blogspot.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário