sábado, 27 de janeiro de 2024

múltiplas poéticas



recife ontem
era só pedra da boa viagem
o mar fugiu do horizonte
e o carnaval está nos muros
e paredes que dançam
ao som dos maracatus
do mato
fotografei um retrato
nas ladeiras de olinda
mas não era linda a íris
na retina da menina
que pariu antes dos 15


Federika Lispector

https://fulinaimargem.blogspot.com 

imagem: Felipe Stefani


AS MULHERES ENVELHECEM

As mulheres envelhecem
Eu, enterneço
usam saias longas e roupas fechadas
eu não ligo pra fachada
utilizo meus mistérios
me uso mulher ...
com as pernas longas
e o bico do seio à mostra..

 

Luiza Silva Oliveira



SENHORAS E SENHORES!

por que tantas coisas no mundo!
a maioria, absurda, feia, maluca.
quando vou ao supermercado comprar ossos de peixe
fico perturbado com a pobreza de tantas coisas.
a mais notável
além de minha imaginação,
PAPEL HIGIÊNICO.

sinais de vida, dejetos em trilhas de animais,
olá coiote, olá veado, olá urso, olá gambá!
para comprar papel higiênico, penso eu,
a Salamandra de Tóquio
tem de ir a Tóquio toda semana?

coma feito o pássaro
durma feito o peixe
pelo mistério dos mamíferos
eu pago impostos à natureza,
todas as manhãs
sem papel higiênico.

no riacho cristalino
despachando minha ex-comida
eu limpo o traseiro com água fresca.
por regiões e estações,
a luz age sobre as flores de muitas maneiras,
forma, cor, aroma -
gentis e amáveis para a sua bunda.
olá glória da manhã, olá camélia, olá magnólia!

a terra da águia
deserto de Pinacate, México
limpo por uma flor de cacto bola
enterrada fundo na areia vulcânica
ah, meu entulho velho
agora pode desabrochar
como uma flor de yucca, a vela do deserto.

ah relva! ah árvore!
deusas do oxigênio, energia, beleza!
indiferentes à infidelidade dos homens
vocês são generosas em
flores na primavera
verdes no verão
escarlates no outono;
olá chuva-de-prata, olá zimbro, olá álamo!
não façam cócegas em meu ânus, olá cogumelo soma!

senhoras e senhores!
ao nascer do sol
apanhem orvalhos furta-cor
na larga folha da taioba,
exorcizem suas nádegas.

crânios fantasmas de árvores sob a pólvora,
fábrica infernal lançando polpa - papéis
empilhar, amontoar, bem alto no supermercado
PAPEL HIGIÊNICO

está chegando
uma enchente de papel higiênico
como diarreia
junto com todas as criaturas
a enchente vai nos arrastar até o Hades.

tapeçaria dos céus -
as penas de nossas irmãs voadoras
espalham-se generosas
nos bosques, praias, pradarias e cidades,
adorável para a sua limpeza,
olá beija-flor, olá carriça do inverno,
olá papa-léguas, olá garça-branca!

buquê de corais do mar,
mas não use anêmonas vivas,
certamente machucam seu traseiro;
algas secas, búzios, OK.

se preferir (um tentáculo de polvo).
encantados por seus dejetos na água rasa
pequenos peixes vêm até você
pegue-os, coma-os por misericórdia.
a grande baleia
olá Moby Dick
lave meu cóccix com o seu jorro!

coluna vertebral da Mãe Terra,
ponte entre a a eternidade, a história humana e sua alma,
o mais afável papel de lavabo
pedra e rocha!
chocado pelo sol
em um leito de riacho
este seixo opalino
respira, cresce e desce
até o outro lado do riacho conosco.
tão macio, tão morno!
dá pra comprar essa beleza no mercado?

aqui, na geleira
ventos que congelam a mente
nada para servir como lenço, mas
veja! passando sobre a morena
um pedaço de nuvem branca.

senhoras e senhores!
já passou da hora.
preciso pagar impostos à terra.
ao longo do riacho límpido
as azaléias do cânion hoje desabrocham.
agachado em uma pequena cachoeira
escutando a canção de um pato-mergulhão
a flor em minha mão
eu medito sobre uma merda alegre,
perfeita cerimônia da circulação universal
tão antiga
tão nova dia após dia.

******
Nanao Sazaki
Tradução: Felipe Melhado 

via Ademir Assunção – no face


três poemas para
desorganizar sábados
e assassinar domingos


se eu soubesse
diria teu nome
essa fome
sangrando janeiros
tuas pernas abertas
ao medo

....................................................

o estômago sempre vazio
é um órgão criativo
esqueça a escassez
alimente incêndios
de poetas
o inferno está cheio

....................................................

os pássaros sabem
o salto contém a queda
para voar
é preciso
cortar asas

.......................................................

se eu soubesse
um verso faria
teus olhos fechados
para reforma
as garrafas não falam
sozinhas

.........................................................

um léxico
de silêncios
para melhor
ouvir
os pelos
crescendo

.........................................................

ela sabe
o que eu não sei
enfiar a língua
até o fundo
do meu ouvido
exterminar a paz
dos domingos
estar ausente
apenas
sendo

noturno em dor maior

a Leonardo Manzoni

um erro sempre serve
se a dor vertendo inverte
se do fácil fogo faz afago
um erro perfeito é muito raro
perícia de preguiça infinita
um despertar de misérias muitas
se das ruas da morte a sorte
do mais perfeito dos erros
essa ilegal mania minha
de verter do inverso o nexo
em noites de contínuo açoite
a súbita invasão desmedida
ladeira abaixo
rio acima

um meta
poema
lírico

a José Luís
dos Santos
( em memória )

do
euro - branco -
cristo - centro

mais um
preto
pra vala

enquanto
a moderna
poesia
burguesa
prospera

euro - demo -
cristo - crática

este não é
um poema -
panfleto

antes
um soco
no vento

versos
apenas
sendo

estorvo
opaco
inútil
cansaço
obscuro
silêncio

eu não
procuro.
eu encontro

uma vela
pra vala
de mais
um preto

toda
novidade
é feia

os poetas
são cúmplices.

uma vergonha
dos versos
verte

disse Samuel
Becket
em meio
aos destroços
de si mesmo

e o circo
aplaudiu

mais um
preto
pra vala

nenhuma
poesia
nestas
salas

apenas
um poema
seco

ou o som
sujo

da mais
suja

das
chuvas

Intertexto:
Aforismos
Pablo Picasso

Ilustração:
Henri Matisse
Harmonia em amarelo
( 1927/1928 )

garbo gomes
UVA.PR.BR
janeiro/ 2023


 

ave, pássaro!

esse menino canta. como uma aventura. como um mensageiro. como um sinal. daqueles que esclarecem. esse menino é fora de moda. porque ele sabe o que faz. com suas mãos, com seu coração. esse menino corre o mundo. acorda todos que estavam esperando por uma palavra bem cantada. pela vida entre a poesia e a música que ele alinha como se fosse um marujo. daquele mar bendito de tantas e tantas mais belas letras, daquelas melodias que pescam os arrecifes dos nossos amores e paixões. como um predestinado caminhante. como um irrefutável mutante. belo homem que caminha em direção ao sonhos dos seus pés, que pisam a brisa de um novo vento. de uma corrente onde, pelo tempo, somos os seus mais aficionados fãs. como uma urbana bússola rural, Chico prepara um recital como poucos. sabe que agora precisamos ser mais. como uma embarcação que nos hospeda, e que nos traz novamente uma célula. uma molécula recheada de amor e da precisa palavra que fala. fala a canção de todos nós, desesperados, por um pouco de poesia e pão sonoro. de uma partitura, partícula que se espalha, distribuindo com o seu colar de horas, uma rota. a rota dos esperançosos homens e mulheres. daqueles e daquelas dispostas, como se fosse a luz dos desejos de quem nunca se esqueceu de sorrir. ontem foi o aniversário de Francisco Cesar Goncalves . uma data de um artista para ser sempre celebrada e celebrado. como tudo que seduz. como tudo que constrói uma permanente barcaça. onde pelas suas bordas, podemos respirar e viver. parabéns amigo Chico César !!!!!!


Cgurgel 


"Aprendi com o povo e com a vida, sou um escritor e não um literato, em verdade sou um obá. Não nasci para famoso nem para ilustre, não me meço com tais medidas, nunca me senti escritor importante, grande homem: apenas escritor e homem”.

Jorge Amado, 49 romances publicados, traduzido para 80 países em mais de 40 línguas.

Só digo uma coisa...baixa a bola, distraídos.

 

Simone Bacelar


O melhor livro de poemas brasileiro publicado em 2023

 

por Henrique Wagner

O melhor livro de poemas brasileiro publicado em 2023 que EU li se chama “Quando chegam os tártaros?”, e foi escrito por Rosana Piccolo. A editora se chama Ofícios Terrestres. Se houver justiça – ou inteligência – na próxima comissão julgadora do Prêmio Jabuti, o livro da Rosana será, no mínimo, semifinalista.
Seus poemas, que me fizeram pensar em Orides Fontela (ambas graduaram-se em Filosofia, aliás), são feitos de osso – nem um pedacinho de carne, muito menos de gordura. E um osso vai roçando outro osso até causar atrito e, naturalmente, dor. À primeira vista, os poemas de Rosana Piccolo podem parecer um amontoado de versos que se aproximaram por meio de uma associação livre lacaniana, mas não se enganem: tudo, absolutamente tudo em “Quando chegam os tártaros?” faz sentido e pode ser compreendido, tal qual a poesia inicialmente hermética de Mallarmé. E quando isso acontece, dá-se o fenômeno da iluminação, da epifania, do susto também (pensamos: como pode alguém ter escrito algo tão bom?). Poesia substantiva, cheia de pontas deliberadamente soltas, e com um grau altíssimo de imaginação (mas nem por isso a poeta se passa por nefelibata), o que encontramos em “Quando chegam os tártaros?” é literatura que está à altura da obra que a inspirou, o grande romance italiano “O deserto dos tártaros”, do genial Dino Buzzati. Quem sabe me animo e faço uma resenha do livro? Abaixo, um poema e a foto da capa.

mesa da calçada

toldos e telhas
odor de bacon nos bares
manchete do pôr do sol

malha, sequelas do meio-dia
batom de lolita
– cereja pisada

panfletos se debulham como pétalas
casarões à brisa
gárgulas

desagasalhadas

golfam grifes de verão
na úmida gravura do meu rosto

 

Rosana Piccolo



o vampiro

come chupa

palavra por palavra

sílaba por sílaba

o sangue de  cada veia

que bombeia

no poema

 

Artur Fulinaíma

https://arturkabrunco.blogspot.com/



CALCINHAS MOLHADAS

bendito é o fruto do vosso ventre!
cócegas no ventre
um líquido gosmento escorre entre minhas pernas
assustada
excitada
vou pedir explicação para o divino

sou açoitada e despejada
por falta de pagamento!!

endividada tento quitar
minhas indulgências

Ah... santo padre, perdoa-me!!!
mas o mundo da luxuria é o mais perfeito
ah... sinto-me agraciada com mais um toque

e a energia sexual se transforma em energia espiritual

mas as cócegas continuam
cada vez mais intensamente
é a comunhão com o divino

é pecado,
diz uma voz pequenina, quase inocente

e uma fila de famintos me esperam
em orgias

fujo pelos porões sepulcrais
escuros, abafados
só vejo anjos nus com seus corpos
atléticos, musculosos

santificada
abençoada
me utilizo da leveza
dos anjos

pego a mão de Afrodite

e sou conduzida pelo deus baco
para mais uma orgia dos deuses!

Virgem Maria, rogai por nós!

 

Luiza Silva Oliveira


quinta-feira, 11 de janeiro de 2024

múltiplas poéticas

 Múltiplas Poéticas

leia mais aqui

https://porradalirica.blogspot.com/


 

A ARTE DOS ESPELHOS

O contrário
impresso
em mistério
espesso

reflete
o vácuo,
dote
do oco,

responde
à imagem,
expande a vertigem,

o inverso
converte
ao reverso
da arte

nova matriz
da sombra,
outra tez da obra,

cristal do corpo,
lúmen,
pericarpo
e sêmen. 

 

Cleber Pacheco 


POEMA DE SOPHIA DE MELLO BREYNER ANDRESEN

 

Eis-me

Tendo-me despido de todos os meus mantos

Tendo-me separado de adivinhos mágicos e deuses

Para ficar sozinha ante o silêncio

Ante o silêncio e o esplendor da tua face

Mas tu és de todos o ausente o ausente

Nem o teu ombro me nem a tua mão me toca

O meu coração desce as escadas do tempo

(em que não moras)

E o teu encontro

São planícies e planícies de silêncio

 

Escura é a noite

Escura e transparente

Mas o teu rosto está para além do tempo opaco

E eu não habito os jardins do teu silêncio

Porque tu és de todos os ausentes o ausente


injúria secreta

 

Suassuna no teu corpo

couro de cor compadecida

Ariano sábio e louco

inaugura em mim a vida

 

Pedra do Reino no riacho

gumes de atalhos na pedreira

menina dos brincos de pérola

pétala na mola do moinho

palavra acesa na fogueira

 

pós os ismos tudo e pós na pele ou nas aranhas

na carne ou nos lençóis no palco ou no cinema

 

a palavra que procuro é clara quando não é gema

até furar os meus olhos com alguma cascata de luz

 

devassa em mim quando transcende

lamparina que acende

e transforma em mel  o que antes era pus

 

Artur Gomes

www.arturgumes.blogspot.com


Doação de livros para a Biblioteca do Povo de Rua do Pe. Júlio

Marcelo Brettas

Anuncio com imensa alegria que na manhã dessa terça (16/01/2024) defini com o querido Pe. Júlio Lancellotti os detalhes para a criação de uma biblioteca para atender os cidadãos e cidadãs que hoje estão relegados à situação de moradia nas ruas. Acompanho as atividades do Pe. Júlio e sei da importância de seu trabalho na tentativa de suprir as necessidades emergenciais de alimentação, vestuário, higiene e moradia, além de resolver uma série de outras questões, como documentação, apoio jurídico, médico e hoje ainda provendo a manutenção de uma padaria própria voltada a doar ao Povo de Rua e de cursos técnicos de costura e informática.


Desde o lançamento de meu livro “Rua qualquer, sem número” uma frase do Pe. Júlio martela a minha cabeça: “eles precisam de livros”. Naquela época o suporte do ProAC me permitiu doar 400 exemplares daquele livro para serem distribuídos entre os moradores em situação de rua. Agora o projeto é mais ambicioso. Junto com Pe. Júlio pretendemos receber a doação de 10 mil livros (prosa, poesia e infantil) nos próximos 30 dias. Eu disponibilizarei perto de mil livros de meu acervo pessoal, o Eduardo Lacerda (da Editora Patuá) já se comprometeu a doar outros mil exemplares e conto com a colaboração de cada um de vocês.
Como a sede da Pastoral do Povo de Rua já está abarrotada com o recebimento e gerenciamento das doações tradicionais, estaremos coletando as doações em endereços alternativos. 

O primeiro ponto de coleta habilitado é a Livraria Patuscada - R. Luís Murat, 40 - Pinheiros, São Paulo - SP, 05436-050

Conto com a divulgação e o apoio de todos!




                    CONSOLO NA PRAIA


Vamos, não chores...
A infância está perdida.
A mocidade está perdida.
Mas a vida não se perdeu.

O primeiro amor passou.
O segundo amor passou.
O terceiro amor passou.
Mas o coração continua.

Perdeste o melhor amigo.
Não tentaste qualquer viagem.
Não possuis casa, navio, terra.
Mas tens um cão.

Algumas palavras duras,
em voz mansa, te golpearam.
Nunca, nunca cicatrizam.
Mas, e o 'humour'?

A injustiça não se resolve.
À sombra do mundo errado
murmuraste um protesto tímido.
Mas virão outros.

Tudo somado, devias
precipitar-te, de vez, nas águas.
Estás nu na areia, no vento...
Dorme, meu filho.
.
Carlos Drummond de Andrade

in "A Rosa do Povo" 


TUDO A VER

 

César Augusto de Carvalho

 Há coisas malucas que acontecem com a gente. Malucas mesmo. Não se encontra explicação.

 Outro dia recebi mensagem de um amigo pedindo-me o endereço. Queria mandar algo que me pertencia. Um livro, claro, pensei.

 Não. Não era um livro. Ao abrir o envelope me deparei com uma plaqueta, o poema da plaqueta datilografado e um texto sobre meu cartão postal, que publiquei em 1986, chamado “Tudo a Ver”. Ambos, o poema e o comentário, com dedicatória da autora, a Hygia Therezinha Calmon Ferreira, à época, 1988, era, além de contista e ensaista, professora da Unesp de São José do Rio Preto.

 Fiquei curioso. Como esse material foi para na mão desse meu amigo? Emprestado eu não tinha. Coisas muito pessoais jamais empresto. Melhor foi perguntar e a resposta foi mais intrigante ainda, ele encontrou no meio de um livro comprado num sebo na Zona Leste, há muitos anos! Só agora, quando resolveu lê-lo encontrou o material e me devolveu.

 A curiosidade morre aqui. Jamais descobrirei o que fiz para colocar itens material tão pessoais no meio de um livro que depois seria vendido num sebo. E vendido não por mim, pois nunca vendo livros para sebo, prefiro doar ou presentear os amigos, mas por um desconhecido.



Ode ao clitóris

impulsivo, criador
mestre e doutarado do amor
esparge doces clemências
em fêmeas com ausências

guardador de flores amorosas
arrebanha amores sem falos

generoso, atrevido
indutor da libido
doce pecador
de fêmeas em ardências
de múltiplos orgasmos
sem evidências...

..

oh! Santa Mãe
desmaio no inferno dantesco
desperto no Nirvana burlesco
do doce aleitamento materno

santo padre das induções
melancólico de ardentes desejos
evita novas conversões...

perseguido e escondido
sai da representação
pra comoção em ação
agitador de orgias femininas...

 

Luiza Silva Oliveira 



Com Os Dentes Cravados Na Memória

 

A Mocidade Independente de Padre Olivácio – A Escola de Samba Oculta No Inconsciente Coletivo, nasceu em dezemvro de 1990, durante uma viagem em que cia de Guiomar Valdez, levamos uma turma de estudantes da então ETFC(IFF), a Ouro Preto-MG, como premiação por terem vencidos a Gincana Cultural desenvolvida durante o ano, pelo Grêmio Estudantil Nilo Peçanha. Lá conheci Gigi Mocidade – A Rainha da Bateria, com quem vivi até 1996.

 

A Igreja Universal do Reino de Zeus, criei em 2002 durante a 1ª Bienal do Livro de Campos dos Goytacazes-RJ, que foi realizada nas dependências do Ginásio de Esportes do então CEFET-Campos, onde na ocasião lancei o livro BraziLírica Pereira : A Traição das Metáforas.

O grande objetivo da IURZ é homenagear deuses deusas da África e Grécia para de alguma forma descobrir de onde vem as nossas ancestralidades. De alguma forma e em alguns momentos mitologia grega e africana se misturam e viajando metaforicamente nessas realidades reinventadas vim desaguar no Vampiro Goytacá canibal Tupiniquim.

 

Artur Gomes

https://arturgumes.blogspot.com/


URGENTEMENTE.


É urgente o amor
É urgente um barco no mar

É urgente destruir certas palavras,
ódio, solidão e crueldade,
alguns lamentos, muitas espadas.

É urgente inventar alegria,
multiplicar os beijos, as searas,
é urgente descobrir rosas e rios
e manhãs claras.

Cai o silêncio nos ombros e a luz
impura, até doer.
É urgente o amor, é urgente
permanecer.

Eugénio de Andrade,
in "Até Amanhã"

foto: o canto da natureza


Série: Fábulas Contemporâneas
Livro: Risca Faca
(Ademir Assunção)


Soneto Da Separação

"De repente do riso fez-se o pranto
Silencioso e branco como a bruma
E das bocas unidas fez-se a espuma
E das mãos espalmadas fez-se o espanto


De repente da calma fez-se o vento
Que dos olhos desfez a última chama
E da paixão fez-se o pressentimento
E do momento imóvel fez-se o drama


De repente, não mais que de repente
Fez-se de triste o que se fez amante
E de sozinho o que se fez contente


Fez-se do amigo próximo, o distante
Fez-se da vida uma aventura errante
De repente, não mais que de repente."

Vinícius de Moraes


Poema de Antonio Gamoneda, crítico de arte e poeta espanhol, vencedor do Prêmio Cervantes de 2006. Está com 92 anos de idade. Tradução de Luís Avelima.

Incandescência e ruínas


I

Eu invoco a cabeça
mais sagrada que exista
sob a neve.

Meu coração azul
canta purificado pelo silêncio.

II

Vândalo de pureza,
fustiga-me. Se falas,
baixarei meus lábios
até a água selvagem.
Daquela gruta onde
abrasa a frescura,
há de surgir um rei
sujo de profecias.

Oh coração que vês
em toda escuridão,
quando estaremos cegos
na luz, quando falarás,
habitante do fogo.

III

Um cão milagroso
come em meu coração.
Cerimônia selvagem:
minha dor se incorpora
ao cão apaixonado.

IV

Na cavidade que conheces,
soa uma voz. Língua fria,
tu, que assobias na noite,
metal vivo de palavras,
dizei-me, louco rouxinol
do inverno, dizei-me, tu,
que talvez participas
de uma matéria luminosa,
a quem anuncias agora
a não ser a morte.

V

Anticanto de amor,
quem te beberá, quem
colocará a boca nesta
espuma proibida.

Quem, que deus, que
enlouquecidas asas
poderão vir, amar
aqui.
Onde não há nada.


SENTENÇA

faz muito tempo que eu venho
nos currais deste comício,
dando mingau de farinha
pra mesma dor que me alinha
ao lamaçal do hospício.


e quem me cansa as canelas
é que me rouba a cadeira,
eu sou quem pula a traseira
e ainda paga a passagem,
eu sou um número ímpar
só pra sobrar na contagem.


por outro lado, em meu corpo,
há uma parte que insiste,
feito um caju que apodrece
mas a castanha resiste,
eu tenho os olhos na espreita
e os bolsos cheios de pedras,
eu sou quem não se conforma
com a sentença ou desfeita,
eu sou quem bagunça a norma,
eu sou quem morre e não deita.

Salgado Maranhão

Do livro: A Cor da Palavra
Prêmio da Academia Brasileira de Letras - 2011





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