LOUVAÇÃO AO POETA
ARTUR GOMES EM SEUS
70 ANOS
Hélio Coelho
Meu caro Artur, Artur Gomes, 70 anos,
hein? Que beleza! Não foi possível comparecer para te abraçar conforme era o
meu desejo e o seu também, nem consegui me manifestar por aqui no face. Mas
fiquei com você o dia todo em meu pensamento.
Relembrei sua trajetória de lutas e
conquistas. Relembrei o carinho e admiração que meu pai tinha por você desde o
Jornal de Campos e Um Instante No Meu Cérebro (aliás, dia desses, Dr. Renato
Aquino, ao encontrar-se comigo, pediu-me que desse um abraço por ele também,
abraço carregado de admiração deste os tempos da Escola Técnica Federal...).
Nossos encontros nos bons tempos dos
bares da vida, da poesia rasgada, do violão solidário parceiro entre primas e
bordões...Lembrei-me de sua presença forte e marcante com sua poesia sensual
erotizando e deixando vir à flor da pele e entrando pelos poros e eriçando os
pelos do tecido social conservador e dos costumes conservadores e as vezes
hipócritas da colonial moral da planície, ó libidinoso fauno...
No teatro das minhas lembranças, te
vi nos palcos com seu atrevimento poético e sua figura - entre apolínea e
dionisíaca - dominando a cena ao dizer sobre o doce mel do prazer da carne, o suave cheiro
do açúcar dos nossos doces, e como um guerreiro goitacá zangado, apontando a
flecha para os exploradores do povo, e denunciando o amargo sabor dos
desgovernos de nossas elites dirigentes...e isso com a coragem dos nossos
quilombolas - que foram tantos - porque vivíamos em pleno período da ditadura
militar e civil-empresarial em nosso país!
Também vieram amenidades de nossos
papos descontraídos sobre mulheres, música, cachaça e outras cositas mais, que
ninguém é de ferro(desculpe o momento de erudição, mas já dizia Nietzsche
"a arte existe para que a realidade
não nos destrua").
Também desfilaram pelos campos do
pensamento nossos encontros nos campos de futebol, eu do meu jeito, e você com
jogadas refinadas de quem foi moleque jogando pelada nos campinhos e terrenos
baldios que outrora existiam por toda parte, não é mesmo? Há quem jure ter visto você falando para a bola: "Vem, Poema número II"...
E foi então que apareceu ao Professor
e atento historiador da cultura campista, entre o ofício e o deslavado amor à
Terra, o Artur conquistador de um
belo espaço no cenário cultural do país com um reconhecimento de muitos
aplausos pelos diversos cantos e antologias atestando sua presença consagrada,
embora você nem ligue pra isso e muitos conterrâneos infelizmente nem deram
conta disso...e você continua andando pra baixo e pra cima pelas ruas de sua
cidade esbanjando o vigor dos sexogenários setentões...
E o que dizer de suas músicas, belas
parcerias e instigantes participações e vitórias No Tempo dos Festivais?
E agora, como é lindo ver o meu filho
Helinho estar atento ao seu trabalho e me dizer: Papai, admiro muito a arte, o
talento do Artur!
Viu, Gato Velho, tá ficando que nem
vinho bom, hein? Passando de geração em geração. E tenho certeza de que assim
permanecerá na alma de nosso povo por muitas e muitas gerações: isso é o que
acontece com quem escreve sua biografia no Bronze da História!
Além do abraço forte, tipo abraço de
Homem da Baixada - que aperta forte em cima mas não deixa que se toquem as
partes "de baixo"-, era
mais ou menos isso que eu queria te falar. Taí o meu abraço e o meu carinho por
você.
Em 1 de setembro de 2018.
Helinho Coelho.
O Poeta faz 70 Anos
por Vania Cruz
HOJE é o aniversário desse amigo
muito querido.
Artur me enche de orgulho pela sua arte sem limites, pela sua simplicidade,
pelo seu talento "sobrenatural".
HOJE completa sete décadas de puro amor a tudo o que faz.
Trabalhamos juntos no IFF por longo
tempo e como aprendi com suas exaltações poéticas, suas apimentadas colocações
nos textos.
Artur Gomes , dentre suas performances, há de se destacar um susto que deu aos
participantes de um curso de Controle Mental, na época, no Palácio da Cultura.
Num exemplo de brasilidade enrolou a Bandeira Nacional no corpo e com um timbre
de voz alto lançava ao vivo e em cores, um poema de tamanha beleza, profético
para o Brasil que estamos vivenciando agora.
Artur é temático em seus gestos e dono de um olhar imperativo. Colhe da Rosa
ao néctar do prazer, toda uma poesia que marca, que seduz e que alucina. " Artur Gomes, nada sabe de
mim."
Viva Mallarmé! Beijos pra você, meu
amigo!
(VCruz)
Artur Gomes
Entrevista :: Concedida a Everi
Carrara
telescópio negro
Everi Carrara : Hilda Hilst "reclamava"
de não ter leitores, obviamente ela não fez uma literatura fácil. Lendo seus
poemas me deparei com uma questão semelhante ao da Hilda. Você não escreve um
poema "fácil" então eu te
pergunto, você escreve para ter leitores?
Artur Gomes: Claro que escrevo para ter leitores, e a Hilda também queria tê-los. A
dificuldade, acredito, está na própria questão das linguagens poéticas. Não
acredito que a minha seja difícil. Talvez a falta de leitura de poesia seja o
fator que dificulte a maioria dos leitores a captar em sua essência a mensagem
do poeta
Everi Carrara : É praticamente uma unanimidade no Brasil a opinião de diversos poetas e
pessoas do público sobre a forma como você diz seus poemas que é considerada
uma das melhores atualmente. Falar poemas é também um oficio?
Artur Gomes - Falar poesia, é um exercício que pratico cotidianamente desde o
instante em que me descobri poeta. Se ser poeta é um ofício, falar poesia , pra
mim também é. Sei que com esta comunicação direta, o poema se torna mais
acessível ao outro, que neste momento deixa de ser leitor, para ser ouvinte, e
o sentido audição lhe permite uma emoção que a leitura silenciosa muitas vezes
não lhe proporciona.
Everi Carara - Tenho curiosidade em saber se o Artur
Gomes que escreve os poemas é o mesmo que os fala. Há "auras" diferentes em cada momento da tua atividade
artística?
Artur Gomes - O instante da criação, o estado de poesia, se dá em um instante
solitário, em que o poeta se depara com os conflitos inerentes a todo ser
humano, é quando o homem está em comunhão com ele mesmo, e ao mesmo tempo em
comunhão com todos os problemas da humanidade, em sintonia com a dor do mundo,
que é também a dele. Neste instante não há muito o que pensar, a não ser,
deixar o imaginário fluir e a escrita ir brotando no papel, ou na tela do
computador.
Agora o ato de falar o poema já
requer outras práticas. No meu caso tento não teatralizar o texto, e sim dotar
a fala de uma sonoridade compatível com o drama ou o humor pertinente que está
contido na palavra escrita. Neste momento o poeta deixa de ser poeta, para se
tornar ator, ou quem sabe personagem de si mesmo.
Everi Carrara - Além de poeta você é também um articulador/produtor, fazendo pontes
para outros artistas e ajudando eventos de grande importância nacional como a
Bienal de Campos, o Fest Campos - de Poesia Falada, o concurso de contos José
Cândido de Carvalho e o Congresso Brasileiro de Poesia de Bento Gonçalves - RS,
onde você ajuda Ademir Bacca na articulação do evento junto ao sudeste
brasileiro. Sobra tempo para jogar pipoca aos macacos?
Artur Gomes - Você me faz lembrar de uma bela canção do Carlos Careqa: Não Dê
Pipoca Aos Macacos, presente no seu disco Os Homens São Todos Iguais.
Bom, Todas estas atividades são
desenvolvidas com intenso prazer, se assim não fosse não valeria a pena. O que
mais importa no caso é a possibilidade de colocar poesia em evidência, o que
para mim é uma tarefa diária. E os Macacos que esperem pela Pipoca...
Everi Carrara - Fulinaíma e Sagaranagens são conceitos inspirados
em Guimarães Rosa e Mário de Andrade? Ou é uma espécie de diálogo
filosófico-poético com a juventude brasileira tão carente de contato com
artistas viscerais?
Artur Gomes - Por instinto natural, sempre gostei de brincar com as palavras,
re-Inventar umas e outras. Não é simplesmente fazer uma reLeitura desse ou
daquele autor, ou de determinada obra . Mas sim, tentar criar através delas
algumas outras. Aí tenho clareza que o meu leque de parceiros na música e no
teatro contribuíram decididamente para aguçar ainda mais essa prática.
Tanto Fulinaíma como Sagaranagens
são frutos que brotaram de projetos desenvolvidos com o objetivo da uma
re-Criação voltada para esses pilares da cultura brasileira contemporânea. A
criação de Fulinaíma, devo ao meu
parceiro Naiman, ela nasce quando ainda estava em cena em São Paulo, com o
projeto Retalhos Imortais do SerAfim,
que apesar do seu foco está centrado em Oswald de Andrade, foi com a mistura
macunaímica de Mário que pensamos temperar o nosso caldeirão de misturas.
Já o Sagaranagens, nasce com a criação do poema Saragaranagens, que é um
pedido de bênção aos mestres, Guimarães Rosa, Drummond e João Cabral. E é claro
que nisso tudo entra a antropofagia
do Oswald, que até hoje causa
rebuliço nos meios culturais paulistanos, por não ser um prato de fácil
digestão, e ao mesmo tempo mais necessária do que nunca. Só a antropofagia nos
salvará nessa selva de pedras.
Everi Cararra - Antes mesmo de se destacar como um mestre da palavra você já era
conhecido como artista visual. Fale um pouco do teu trabalho nesta área.
Artur Gomes - Em 1983, ainda em Campos dos Goytacazes minha terra natal, , criei o
projeto Mostra Visual de Poesia
Brasileira, que é uma exposição gráfico.visual com as linguagens
experimentais que podemos detectar a partir do modernismo. A partir daí comecei
a estreitar contato com grandes poetas do país e do exterior que já há algum
tempo trabalhavam com o poema visual e outras linguagens mais experimentais
onde a visualidade é o foco principal.
Esse projeto teve vários desdobramentos e a
cada exposição de acordo com o objetivo que tentávamos alcançar definia as
características da poesia que iríamos expor. Considero esse trabalho bem
singular em minha produção poética. Pois a criação se dava estritamente no
campo experimental, com collagens, instalações, interferências, onde a
utilização de material plástico, papel, retalhos de tecidos, e todo e qualquer
outro tipo de retalho permeava a peça que acabava sendo composta.
Acho que o momento áureo desse
trabalho se dá com os Retalhos Imortais
do SerAfim, onde através de várias linguagens procurava no projeto reCriar
o livro Serafim Ponte Grande, de Oswald de Andrade.
Mas é com a palavra escrita que
procuro definir a minha condição de poeta no planeta terra, estando sempre
levando essa palavra a todas as fronteiras possíveis, como a sonoridade por
exemplo, ou ao áudio visual, que está também sempre presente na minha criação.
Everi Carrara - Quem você lê?
Artur Gomes - Em poesia leio uma infinidade de poetas clássicos, ou não, e toda
poesia que chega para o FestCampos de Poesia Falada, muitas delas, de
poetas que ainda não conhecia. E claro: os nossos mestres, Drummond, João
Cabral, Oswald e Mário de Andrade, Paulo Leminski, Mário Faustino, Torquato
Neto, Murilo Mendes, Baudelaire, Augusto e Haroldo de Campos, Mallarmé, Manuel
Bandeira, Mário Quintana, Manoel de Barros, Ferreira Gullar, Hilda Hilst e Ana
Cristina César.
Acabei de ler recentemente também o
livro Plano de Vôo, de Ademir Atônio Bacca, poeta gaúcho de Bento Gonçalves-RS.
Criador do Congresso Brasileiro de Poesia.
Everi Carrara - Quem você considera hoje o primeiro time da poesia no Brasil? E no
mundo?
Artur Gomes - É muito difícil definir esse primeiro time. Esse time aí de cima é de
primeira. Mas temos também ainda de uma forma submersa, uma dezena de grandes
poetas em franca produtividade como Ademir Assunção, Chacal, Ricardo Aleixo,
Celso Borges, Celso de Alencar, Rodrigo Garcia Lopes, Marcelo Montenegro, Tanussi
Cardoso, Marcus Vinicius Quiroga, Helena Ortiz, Antônio Cícero, Igor Fagundes, Frederico
Barbosa, Claudio Daniel, Aclyse de Mattos, Aricy Curvello, Dalila Teles Veras, Fabiano
Calixto, Diana de Hollanda, Zhô Bertholini, Lau Siqueira, Demetrios Galvão,
Alexandre Guarnieri, Wanda Monteiro, Carvalho Junior, e por aí vai...
Everi Crrara - Quem é Artur Gomes por Artur Gomes?
Artur Gomes - Um ser, social, erótico, religioso, sagarânico fulinaímico, preocupado com as questões
humanas dos seres que habitam este nosso conturbado planeta. Corre em minhas veias
o sangue dos Goytacazes, mas descobri recentemente que tenho um pouco de
yanomamis, principalmente na língua, que estranha para os índios de outra
tribos.
ode inacabada, quanto caos
diga-me grande deus/pessoa
como é possível encarnar
o impossível?
a flauta toca as vértebras
vazando carnes e músculos
antes da chegada aos ossos
a água na pele são
rajadas elétricas
como facões no escuro
luz da paixão d/entre o caos
estilhaços da alma sem dó
eu falo no que posso
mar estético mangue estático
e este desejo tântrico
de não ser daqui
cacomanga
era uma terra intácta
em seus milênios de solidão
cavalos pastam nas cocheiras
esporas na pele borboletas
eu tenho os nervos de nylon
cordões esticados na sala
a língua retesada pra fora
lâmpadas de gás me devoram
faíscas na dor do trovão
o poema vai nascendo outro
explode no ventre/palavras
em intestinos roucos
num temporal de letras
que não se completam
nesta cidade de morrer na praia
Artur Gomes
O Poeta Enquanto Coisa
www.secretasjuras.blogspot.com
Artur Gomes
FULINAIMAGEM
www.fulinaimagens.blogspot.com
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