sábado, 9 de outubro de 2021

Artur Gomes - EntreVistas

 


LOUVAÇÃO AO POETA

ARTUR GOMES EM SEUS

 70 ANOS

 Hélio Coelho

 Meu caro Artur, Artur Gomes, 70 anos, hein? Que beleza! Não foi possível comparecer para te abraçar conforme era o meu desejo e o seu também, nem consegui me manifestar por aqui no face. Mas fiquei com você o dia todo em meu pensamento.

 Relembrei sua trajetória de lutas e conquistas. Relembrei o carinho e admiração que meu pai tinha por você desde o Jornal de Campos e Um Instante No Meu Cérebro (aliás, dia desses, Dr. Renato Aquino, ao encontrar-se comigo, pediu-me que desse um abraço por ele também, abraço carregado de admiração deste os tempos da Escola Técnica Federal...).

 Nossos encontros nos bons tempos dos bares da vida, da poesia rasgada, do violão solidário parceiro entre primas e bordões...Lembrei-me de sua presença forte e marcante com sua poesia sensual erotizando e deixando vir à flor da pele e entrando pelos poros e eriçando os pelos do tecido social conservador e dos costumes conservadores e as vezes hipócritas da colonial moral da planície, ó libidinoso fauno...

 No teatro das minhas lembranças, te vi nos palcos com seu atrevimento poético e sua figura - entre apolínea e dionisíaca - dominando a cena ao dizer sobre  o doce mel do prazer da carne, o suave cheiro do açúcar dos nossos doces, e como um guerreiro goitacá zangado, apontando a flecha para os exploradores do povo, e denunciando o amargo sabor dos desgovernos de nossas elites dirigentes...e isso com a coragem dos nossos quilombolas - que foram tantos - porque vivíamos em pleno período da ditadura militar e civil-empresarial em nosso país!

 Também vieram amenidades de nossos papos descontraídos sobre mulheres, música, cachaça e outras cositas mais, que ninguém é de ferro(desculpe o momento de erudição, mas já dizia Nietzsche "a arte existe para que a realidade não nos destrua").

 Também desfilaram pelos campos do pensamento nossos encontros nos campos de futebol, eu do meu jeito, e você com jogadas refinadas de quem foi moleque jogando pelada nos campinhos e terrenos baldios que outrora existiam por toda parte, não é mesmo? Há quem jure ter  visto você falando para a bola: "Vem, Poema número II"...

 E foi então que apareceu ao Professor e atento historiador da cultura campista, entre o ofício e o deslavado amor à Terra, o Artur conquistador de um belo espaço no cenário cultural do país com um reconhecimento de muitos aplausos pelos diversos cantos e antologias atestando sua presença consagrada, embora você nem ligue pra isso e muitos conterrâneos infelizmente nem deram conta disso...e você continua andando pra baixo e pra cima pelas ruas de sua cidade esbanjando o vigor dos sexogenários setentões...

E o que dizer de suas músicas, belas parcerias e instigantes participações e vitórias No Tempo dos Festivais?

 E agora, como é lindo ver o meu filho Helinho estar atento ao seu trabalho e me dizer: Papai, admiro muito a arte, o talento do Artur!

 Viu, Gato Velho, tá ficando que nem vinho bom, hein? Passando de geração em geração. E tenho certeza de que assim permanecerá na alma de nosso povo por muitas e muitas gerações: isso é o que acontece com quem escreve sua biografia no Bronze da História!

 Além do abraço forte, tipo abraço de Homem da Baixada - que aperta forte em cima mas não deixa que se toquem as partes "de baixo"-, era mais ou menos isso que eu queria te falar. Taí o meu abraço e o meu carinho por você.

 Em 1 de setembro de 2018.

 Helinho Coelho.


O Poeta faz 70 Anos

por Vania Cruz

 

HOJE é o aniversário desse amigo muito querido.

Artur me enche de orgulho pela sua arte sem limites, pela sua simplicidade, pelo seu talento "sobrenatural". HOJE completa sete décadas de puro amor a tudo o que faz.

Trabalhamos juntos no IFF por longo tempo e como aprendi com suas exaltações poéticas, suas apimentadas colocações nos textos.

 

Artur Gomes , dentre suas performances, há de se destacar um susto que deu aos participantes de um curso de Controle Mental, na época, no Palácio da Cultura. Num exemplo de brasilidade enrolou a Bandeira Nacional no corpo e com um timbre de voz alto lançava ao vivo e em cores, um poema de tamanha beleza, profético para o Brasil que estamos vivenciando agora.

 

Artur é temático em seus gestos e dono de um olhar imperativo. Colhe da Rosa ao néctar do prazer, toda uma poesia que marca, que seduz e que alucina. " Artur Gomes, nada sabe de mim."

 

Viva Mallarmé! Beijos pra você, meu amigo!

 

(VCruz)




 Artur Gomes

Entrevista :: Concedida a Everi Carrara

telescópio negro

 

Everi Carrara : Hilda Hilst "reclamava" de não ter leitores, obviamente ela não fez uma literatura fácil. Lendo seus poemas me deparei com uma questão semelhante ao da Hilda. Você não escreve um poema "fácil" então eu te pergunto, você escreve para ter leitores?

Artur Gomes: Claro que escrevo para ter leitores, e a Hilda também queria tê-los. A dificuldade, acredito, está na própria questão das linguagens poéticas. Não acredito que a minha seja difícil. Talvez a falta de leitura de poesia seja o fator que dificulte a maioria dos leitores a captar em sua essência a mensagem do poeta

 Everi Carrara : É praticamente uma unanimidade no Brasil a opinião de diversos poetas e pessoas do público sobre a forma como você diz seus poemas que é considerada uma das melhores atualmente. Falar poemas é também um oficio?

 Artur Gomes - Falar poesia, é um exercício que pratico cotidianamente desde o instante em que me descobri poeta. Se ser poeta é um ofício, falar poesia , pra mim também é. Sei que com esta comunicação direta, o poema se torna mais acessível ao outro, que neste momento deixa de ser leitor, para ser ouvinte, e o sentido audição lhe permite uma emoção que a leitura silenciosa muitas vezes não lhe proporciona.

 Everi Carara - Tenho curiosidade em saber se o Artur Gomes que escreve os poemas é o mesmo que os fala. Há "auras" diferentes em cada momento da tua atividade artística?

 Artur Gomes - O instante  da criação, o estado de poesia, se dá em  um instante solitário, em que o poeta se depara com os conflitos inerentes a todo ser humano, é quando o homem está em comunhão com ele mesmo, e ao mesmo tempo em comunhão com todos os problemas da humanidade, em sintonia com a dor do mundo, que é também a dele. Neste instante não há muito o que pensar, a não ser, deixar o imaginário fluir e a escrita ir brotando no papel, ou na tela do computador.

 Agora o ato de falar o poema já requer outras práticas. No meu caso tento não teatralizar o texto, e sim dotar a fala de uma sonoridade compatível com o drama ou o humor pertinente que está contido na palavra escrita. Neste momento o poeta deixa de ser poeta, para se tornar ator, ou quem sabe personagem de si mesmo.

 Everi Carrara - Além de poeta você é também um articulador/produtor, fazendo pontes para outros artistas e ajudando eventos de grande importância nacional como a Bienal de Campos, o Fest Campos - de Poesia Falada, o concurso de contos José Cândido de Carvalho e o Congresso Brasileiro de Poesia de Bento Gonçalves - RS, onde você ajuda Ademir Bacca na articulação do evento junto ao sudeste brasileiro. Sobra tempo para jogar pipoca aos macacos?

 Artur Gomes - Você me faz lembrar de uma bela canção do Carlos Careqa: Não Dê Pipoca Aos Macacos, presente no seu disco Os Homens São Todos Iguais.

 Bom, Todas estas atividades são desenvolvidas com intenso prazer, se assim não fosse não valeria a pena. O que mais importa no caso é a possibilidade de colocar poesia em evidência, o que para mim é uma tarefa diária. E os Macacos que esperem pela Pipoca...

Everi Carrara - Fulinaíma e Sagaranagens são conceitos inspirados em Guimarães Rosa e Mário de Andrade? Ou é uma espécie de diálogo filosófico-poético com a juventude brasileira tão carente de contato com artistas viscerais?

 Artur Gomes - Por instinto natural, sempre gostei de brincar com as palavras, re-Inventar umas e outras. Não é simplesmente fazer uma reLeitura desse ou daquele autor, ou de determinada obra . Mas sim, tentar criar através delas algumas outras. Aí tenho clareza que o meu leque de parceiros na música e no teatro contribuíram decididamente para aguçar ainda mais essa prática.

 Tanto Fulinaíma como Sagaranagens são frutos que brotaram de projetos desenvolvidos com o objetivo da uma re-Criação voltada para esses pilares da cultura brasileira contemporânea. A criação de Fulinaíma, devo ao meu parceiro Naiman, ela nasce quando ainda estava em cena em São Paulo, com o projeto Retalhos Imortais do SerAfim, que apesar do seu foco está centrado em Oswald de Andrade, foi com a mistura macunaímica de Mário que pensamos temperar o nosso caldeirão de misturas.

 Já o Sagaranagens, nasce com a criação do poema Saragaranagens, que é um pedido de bênção aos mestres, Guimarães Rosa, Drummond e João Cabral. E é claro que nisso tudo entra a antropofagia do Oswald, que até hoje causa rebuliço nos meios culturais paulistanos, por não ser um prato de fácil digestão, e ao mesmo tempo mais necessária do que nunca. Só a antropofagia nos salvará nessa selva de pedras.

 Everi Cararra - Antes mesmo de se destacar como um mestre da palavra você já era conhecido como artista visual. Fale um pouco do teu trabalho nesta área.

 Artur Gomes - Em 1983, ainda em Campos dos Goytacazes minha terra natal, , criei o projeto Mostra Visual de Poesia Brasileira, que é uma exposição gráfico.visual com as linguagens experimentais que podemos detectar a partir do modernismo. A partir daí comecei a estreitar contato com grandes poetas do país e do exterior que já há algum tempo trabalhavam com o poema visual e outras linguagens mais experimentais onde a visualidade é o foco principal.

 Esse projeto teve vários desdobramentos e a cada exposição de acordo com o objetivo que tentávamos alcançar definia as características da poesia que iríamos expor. Considero esse trabalho bem singular em minha produção poética. Pois a criação se dava estritamente no campo experimental, com collagens, instalações, interferências, onde a utilização de material plástico, papel, retalhos de tecidos, e todo e qualquer outro tipo de retalho permeava a peça que acabava sendo composta.

 Acho que o momento áureo desse trabalho se dá com os Retalhos Imortais do SerAfim, onde através de várias linguagens procurava no projeto reCriar o livro Serafim Ponte Grande, de Oswald de Andrade.

 Mas é com a palavra escrita que procuro definir a minha condição de poeta no planeta terra, estando sempre levando essa palavra a todas as fronteiras possíveis, como a sonoridade por exemplo, ou ao áudio visual, que está também sempre presente na minha criação.

 Everi Carrara - Quem você lê?

 Artur Gomes - Em poesia leio uma infinidade de poetas clássicos, ou não, e toda poesia que chega para o   FestCampos de Poesia Falada, muitas delas, de poetas que ainda não conhecia. E claro: os nossos mestres, Drummond, João Cabral, Oswald e Mário de Andrade, Paulo Leminski, Mário Faustino, Torquato Neto, Murilo Mendes, Baudelaire, Augusto e Haroldo de Campos, Mallarmé, Manuel Bandeira, Mário Quintana, Manoel de Barros, Ferreira Gullar, Hilda Hilst e Ana Cristina César.

 Acabei de ler recentemente também o livro Plano de Vôo, de Ademir Atônio Bacca, poeta gaúcho de Bento Gonçalves-RS. Criador do Congresso Brasileiro de Poesia.

 Everi Carrara - Quem você considera hoje o primeiro time da poesia no Brasil? E no mundo?

 Artur Gomes - É muito difícil definir esse primeiro time. Esse time aí de cima é de primeira. Mas temos também ainda de uma forma submersa, uma dezena de grandes poetas em franca produtividade como Ademir Assunção, Chacal, Ricardo Aleixo, Celso Borges, Celso de Alencar, Rodrigo Garcia Lopes, Marcelo Montenegro, Tanussi Cardoso, Marcus Vinicius Quiroga, Helena Ortiz, Antônio Cícero, Igor Fagundes, Frederico Barbosa, Claudio Daniel, Aclyse de Mattos, Aricy Curvello, Dalila Teles Veras, Fabiano Calixto, Diana de Hollanda, Zhô Bertholini, Lau Siqueira, Demetrios Galvão, Alexandre Guarnieri, Wanda Monteiro, Carvalho Junior, e por aí vai...

 Everi Crrara - Quem é Artur Gomes por Artur Gomes?

 Artur Gomes - Um ser, social, erótico, religioso, sagarânico  fulinaímico, preocupado com as questões humanas dos seres que habitam este nosso conturbado planeta. Corre em minhas veias o sangue dos Goytacazes, mas descobri recentemente que tenho um pouco de yanomamis, principalmente na língua, que estranha para os índios de outra tribos.


ode inacabada, quanto caos

 

diga-me grande deus/pessoa

como é possível encarnar

o impossível?

 

a flauta toca as vértebras

vazando carnes e músculos

antes da chegada aos ossos

 

a água na pele são

rajadas elétricas

como facões no escuro

luz da paixão d/entre o caos

estilhaços da alma sem dó

 

eu falo no que posso

mar estético mangue estático

e este desejo tântrico

de não ser daqui

 

cacomanga

era uma terra intácta

em seus milênios de solidão

 

cavalos pastam nas cocheiras

esporas na pele borboletas

eu tenho os nervos de nylon

 

cordões esticados na sala

a língua retesada pra fora

lâmpadas de gás me devoram

faíscas na dor do trovão

 

o poema vai nascendo outro

explode no ventre/palavras

em intestinos roucos

 

num temporal de letras

que não se completam

nesta cidade de morrer na praia

 

Artur Gomes

O Poeta Enquanto Coisa

www.secretasjuras.blogspot.com




Artur Gomes

FULINAIMAGEM

www.fulinaimagens.blogspot.com

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