sexta-feira, 4 de março de 2022

Coletânea Poetas Vivos - Malu Pera

 


 Sobrevivente

 

De asas em voos rasantes

Nuvens e arco-íris

Ondas sonoras

Viagens interplanetárias

Eu tenho vivido

 

Os mecanismos do pouso

Tanto quanto o arremesso 

Do peso

Na distância possível

Pela força do próprio braço

Eu tenho sentido

 

Por córregos rasos ou

Rios de lama 

Antes alimentando peixes

Que alimentavam homens

Eu tenho atolado 

 

Dos pés a cabeça

Tenho salvado vidas

Incluindo a minha

E com o medo

Eu tenho negociado

 

E por onde se corre o sangue

Que pulsa veia

Ainda que no enfarte

Do meu coração 

Eu tenho amado

 

 

Vida

 

Eu sou um livro aberto

E esse vento 

Que revira minhas páginas

Sabe que as palavras do meu ser

Jamais voarão 

E essa chuva 

Que forma correntezas  

Dentro de mim

Sabe que nem mesmo a enxurrada

Transbordara o que foi escrito ali

E até mesmo o sol

Amarelando folhas e destorcendo as linhas

Sabe que ainda assim

Não será capaz de apagá-las

 

São lembranças 

Escritas com letras de mão 

Nesse livro que sou

Sobrevivente do tempo

 

O tempo....

Satisfeito em sua lida

Constância diária 

De fechar-me

 

 

Sem palavras

 

Enquanto eu me perdia por entre as linhas desse papel que mais parecem agora o horizonte inalcançável,  passaram-se dias nublados de garoa fina e noites intermináveis de poemas minguantes.

 Em vendavais a dissolver as palavras como as nuvens que brincam de chover, os dias aqui se vão sem que eu possa, sem que eu valha ou me entenda.

 Tentei em um salto só passar de um abismo ao outro como se passa por uma paisagem a 120km por hora.

 Dormi em calçadas frias ao relento e em palácios almocei com a tirania sem poder tirar dessa viagem uma linha sequer de minha solidão.

 E aqui estou ainda a margem dessa loucura sóbria, densa e caótica onde todos os dias o amanhecer vem me visitar para que o tempo, simplesmente passe...

 Mas a lua, a lua não,  ela me paralisa no instante em que me reflete no clarão deste papel,  fazendo de mim minha própria visita no silêncio de sua chegada sem um gole sequer de linha escrita ou de calma ou de piedade.

 A ponta afiada da minha faca nunca mais adentrou os buchos dos meus fantasmas , nunca mais uma tripa exposta das minhas decepções. 

 Minha casa parece vazia com o chão que se foi junto às linhas em que me emaranhei mas não escrevi.

 

Malu Pera_ pandemia

 

Malu Pera, fotógrafa, amante da poesia, gosta de flertar com ela rabiscando sentimentos...

Projeto atual: Exposição fotográfica Transcender - Um olhar para a Mulher Transexual e Travesti que junta essas duas manifestações artísticas (foto e escrita).




Nação Goytacá

www.fulinaimargem.blogspot.com

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