8M
* Uma mulher por dia! (em nova
versão: 'Uma mulher por semana'!)
Mulheres não apenas em março.
Mulheres em janeiro, fevereiro, maio.
Mulheres a rodo, sem rodeios nem
receios.
Mulheres quem somos, quem queremos.
Mulheres que adoramos.
Mulheres de luta, de luto, de foto,
de fato.
Mulheres reais, fantasias, eróticas,
utópicas.
Mulheres de verdade, identidade,
realidade.
Dias mulheres virão,
mulheres verão,
pra crer, pra valer!
Nic Cardeal
Natural de São Paulo/SP, Sonia R. Bischain mora na Vila
Penteado, distrito de Brasilândia, periferia da capital. É escritora
(romancista, contista, poeta), fotógrafa e design. Fez diagramação,
capa/fotografia/ilustração de seus livros e de outros publicados por coletivos
e saraus da periferia de SP. Participou em várias exposições fotográficas
individuais e coletivas em casas de cultura, bibliotecas e saraus de SP. Fez
parte de eventos literários no Brasil, França, Cuba, Paraguai, Chile e
Argentina. É uma das organizadoras do 'Sarau
da Brasa', que acontece desde 2008, com um trabalho voltado para a
literatura em bibliotecas e escolas públicas da região do Distrito de
Brasilândia.
Em julho de 2015 participou do '4º Encontro Internacional de Poesia Hablada', em Havana/Cuba. Em janeiro de
2016 seu romance 'Nem tudo é Silêncio'
foi apresentado por Paulo Thomaz, da UnB, em Santiago de Compostela/Espanha, no 'IV Colóquio Internacional de Literatura Brasileira Contemporânea'.
Com a mesma obra, que trata da vida
na periferia de São Paulo durante a ditadura militar, a escritora também
participou de um debate na Sorbonne, em Paris, em outubro de 2017, apresentando
o poema 'Travessia' no Simpósio
Internacional (org. dos prof. Leonardo Tonus e Ricardo Barberena). É integrante
do movimento 'Mulherio das Letras'.
Livros publicados: 'Rua de trás' (poemas, São Paulo/SP:
Coletivo Cultural Poesia na Brasa, 2009); 'Nem
tudo é silêncio' (romance, São Paulo/SP: Coletivo Cultural Poesia na Brasa,
2010); 'Vale dos atalhos' (romance,
São Paulo/SP: Editora Sundermann, 2013); Olhares
da Brasa - fotografia, cultura daqui' (livro de fotografias, em coautoria
com Avelino Regicida e Enver Padovezzi, São Paulo/SP: SD Edições, 2015); 'Viandante, labirintos entressonhos' (romance, São Paulo/SP:
Círculo Contínuo Editorial, 2017); e 'Olhares
que devoram sonhos' (contos, Jaú/SP: 11 Editora, 2019).
Participação em antologias e
coletâneas: 'Brasil Periférica -
Literatura Marginal de São Paulo' (antologia bilíngue, org. Lucía Tennina,
publicada na Argentina e no México, em 2014, e no Chile, em 2016); 'Antologia de Poesias Mulherio das Letras' (org. Vanessa Ratton, São Paulo/SP: Costelas Felinas, 2017); '2a. Coletânea Poética Mulherio das Letras'
(org. Vanessa Ratton, São Paulo/SP: ABR Editora, 2018); 'I Coletânea Contos &
Poesias Mulherio pela Paz' (org. Alexandra Magalhães Zeiner e Vanessa
Ratton, São Paulo/SP: ABR Editora, 2018); 'Sou
Mulher, Logo Existo! Amor,
Liberdade, Luta e Resistência - 3a.
Coletânea de Poesias e Prosas Mulherio das Letras' (org. Vanessa Ratton, São
Paulo/SP: ABR Editora, 2019); 'Antologia
Comemorativa Dia Internacional da Mulher Mulherio das Letras Portugal - Prosa e
Conto' (org. Adriana Mayrinck, Lisboa-PT: In-finita, 2019); 'Coletânea de Poesias e Contos O Livro das
Marias' (org. Jeovânia Pinheiro do Nascimento, São Paulo/SP: Editora
Ixtlan, 2019); 'Coletânea A Obra de
Maria Valéria Rezende - Resenhas e
Variações' (org. Adriana Mayrinck e Vanessa Ratton, Lisboa-PT: In-finita,
Santos/SP: Amare Livros, 2021); entre outras.
Emocione-se com a poética
intensamente realista de Sonia Regina
Bischain:
1)
"MÃES EM LUTA
O rosto,
noite de tempestade e dor.
A voz,
fortaleza, a clamar por justiça.
O olhar, amor
a desfilar sombras.
Os pés,
incansáveis a procurar
imagens roubadas pelo tempo.
As lembranças,
a saudade,
e o desejo
a recompor cenas,
repletas de lapsos,
não lhe trariam de volta
o filho amado,
mas, quiçá,
acalmariam a dor.
Enfiou sentimentos
e lembranças
no fundo do peito
e saiu para a luta,
mesmo sabendo
que o medo mora na esquina."
(* Sonia R. Bischain, poema extraído de sua TL Facebook, de
02/02/2014)
-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-
2)
"TECENDO A VIDA
O sol empurra,
lentamente,
pra um canto do céu,
a lua.
Hora de nascer o dia.
Sai Maria,
meio-sol-meia-lua
arrastando Pedrinho,
filho bastardo
de um outro Pedro.
Pedrinho aos berros:
"quero minha mãe!"
Pedrinho na creche.
Maria,
avançada em anos,
filha, mãe, avó
réplica de tantas Marias,
cuidados, suor e pão.
Maria volteando,
fogão,
pia,
louça,
vassoura.
Roupa,
tanque,
sabão,
sol,
pregador,
varal.
E vai o sol,
e vem Pedrinho
e volta Maria, filha.
Retorna a lua,
volteando o ciclo:
água,
sabonete,
travesseiro,
lençol.
Maria vó,
nua e só.
Ciclo infinito!
Dor e pranto
feito lição no peito.
Desmedida luta.
Cintilando ternura
onde é tão pouca coisa
ser Maria.
Maria desvelo,
porção-sol-e-lua,
volteando,
arremata dires,
tece sorrisos,
borda esperanças,
costura sonhos."
(* Sonia R. Bischain, poema publicado na 'Antologia de Poesias
Mulherio das Letras', págs. 12/13)
-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-
3)
"TRAVESSIA
Ficar não mais é possível, procuro um
lugar para sonhar.
Sonho mundos sem cercas, sem
bandeiras.
Partida, travessia: sol escaldante,
chuva, vento de inverno.
No corpo, farrapos. Nos pés, lesões
da longa caminhada.
Caminho sem olhar para trás.
Tento esquecer a hora trágica dos que
sucumbiram,
dos que não chegarão a lugar algum.
Tudo ficou no passado, a vida me cabe
nas mãos.
Levo apenas memórias, ou o que delas
restou: feridas na alma.
Travessia, estado de espera.
Quisera eu ser água, vento, luzes,
transpondo fronteiras.
Sou um frágil vaso, vazio. Sou
incerta morada.
Minh’alma se desprende de mim, grita
e chora,
segue o vento, e nada de novo.
Espero, contemplo, e nada. De novo!
Quem ousei chamar de irmão, guarda
silêncios!
Então, deixarei de ser vento, serei
somente espera.
A cada alvorada, sinto esgueirar-se
a magia da esperança, me furtando as
forças.
Prostrado espero, me perco.
Não sei mais o que sou, sou sombra,
sou gente? Existo?
O mundo não me abraça.
Sou onze milhões de refugiados.
Sou sessenta e cinco milhões de
deslocados.
Sou palestino expatriado em meu chão.
Sou haitiano, venezuelano, mexicano.
Sou angolano, congolês, sírio,
somali.
Sou mulher, sou homem, sou idoso, sou
jovem, sou criança.
Sou resistência, rompendo cercas,
muros,
cruzando desertos, mares.
Estou no Oriente Médio, no Leste
Europeu,
Estou na Palestina, na Jordânia, na
Turquia, no Paquistão,
no Líbano, na África, na Ásia, nas
Américas,
vivendo tantas mortes.
Travessia… Serei apanhado, preso,
abatido?
Serei humilhado, devolvido, faminto e
aos farrapos,
a uma terra devastada?
A escuridão da noite, traiçoeira,
me sepultará nas profundezas do
oceano?
Os filhos que me restam, sucumbirão
comigo?
Serão enviados ao desconhecido?
Falarão outros idiomas, conhecerão
outros costumes?
Travessia… Ficar não mais é possível.
A luta é maior que o medo. A dor,
maior que a luta.
O mar, maior que a dor. A fome, maior
que o mar.
Ah, imensidão de mar!
Que suas águas não me entreguem
em praia estrangeira, desfalecido,
sem vida.
Travessia… Serei acolhido? Terei um
novo lar?
Sobreviverei pela ajuda humanitária?
Viverei à espera, em campo de
refugiados? Retornarei?
Contemplarei, um dia, minha terra
restaurada?
Bato às portas do mundo civilizado: o
mundo dos que têm.
Sou o outro lado: o mundo dos que
carecem.
Sou estranho pesadelo.
Levantei dos escombros, das cidades
destruídas pelas bombas, pelos mísseis e pelas armas químicas. Sou herança de
muitas guerras."
(* Sonia R. Bischain, poema publicado na revista Amazonas, 18/06/2018;
e na '2a. Coletânea Poética Mulherio das
Letras', págs. 39/40)
-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-
4)
"ÀS MARGENS DA VIDA
Naquelas noites de infância,
o mundo girava feliz,
refletindo estrelas em gotas de
orvalho.
Seu pequeno coração ardia esperanças.
Seu olhar de segredos e distâncias,
inocente, sonhava belo destino,
quimeras, calmaria, paz,
futuro sem grilhões.
Despertou assustado,
às margens do dia.
Nestas paragens,
uma estranha ordem das coisas:
botas negras, leis,
fardas impiedosas.
Destino que se cumpre
sem pedir licença,
atirando-o contra o nada,
feito mar em ressaca,
onda morrendo na praia.
Angústia, rumores de medo,
lágrimas e morte. Denúncias vãs.
Enquanto piedosas mãos
acendem velas, vozes,
entre sombras, alçam fronteiras,
ardem desejos.
Outras vozes reivindicam
sonhos não nascidos, lutam,
alimentam sonhos livres."
(* Sonia R. Bischain, poema publicado na I Coletânea Contos & Poesias Mulherio pela Paz', pág. 83)
-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-
5)
"AMNÉSIA
Ah, se eu tivesse memória!
Contaria, quem sabe, a tua história.
Se eu tivesse memória,
talvez também a minha.
Meu silêncio e o teu
frutos de nossa ignorância.
Ignorância, castigo maior,
esperança morta,
subtraído destino.
Como segredo
me é negada a história.
Ah, se eu tivesse memória,
nada no pensamento seria calmo.
Justiça no mundo é lenta,
lembro e esqueço
que por mim passou um dia.
Traição desmedida,
desgraça premeditada,
inflamada cobiça.
Como foi ainda está
a reinventar o inferno na Terra.
Obstáculos, abismos,
sucessivas humilhações,
multidões de famintos,
legiões de esfarrapados.
Passado encerrado
no tempo silencioso.
Ah, se eu tivesse memória!
Como condenados
multiplicam-se os miseráveis,
heróis derrotados,
destino ausente,
desigualdade.
Procuro a direção do sol.
Quem me salvará?
Quem pra me tirar dos sonhos?
Neste chão maldito e bendito,
ah, se eu tivesse memória!
Eu contaria a tua história,
quem sabe também a minha?
Mas memória me foi negada
tudo que me vendem
são histórias inventadas."
(* Sonia R. Bischain, poema publicado na 'Revista Ruído Manifesto', 06/06/2019)
-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-
6)
"QUE NÃO SEJA TARDE!
Haveremos de emudecer
o pranto, a dor, a angústia.
Haveremos de sair da penumbra,
das ruínas, das prisões.
Haveremos de arrancar as grades
escancarar janelas, portas
e saudar os raios de sol.
Haveremos de cruzar
as fronteiras da esperança
e enxergar a realidade sem culpas,
sem sombras, sem mentiras.
Haveremos de evocar,
decorar, gritar
os nomes dos injustiçados
guardados em nossa memória.
Haveremos de enfrentar
o medo, a angústia,
de quebrar as algemas,
de transpor as portas das tormentas,
de reviver todas as faces da
rebeldia.
Haveremos de reaprender
a lutar, a voar
e transbordar de sonhos nossos
dias."
(* Sonia R. Bischain, poema publicado na 'Revista Ruído Manifesto'
, 06/06/2019)
-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-
7)
"INDIVISÍVEL
Como se fôssemos parte de tudo:
o visível e o invisível;
o compreensível e o inexplicável,
como elemento único, universal.
Como se o risco de perder o futuro
atemorizasse a todos
e cada árvore derrubada,
cada rio poluído,
cada animal extinto
se tornasse angústia em nós,
como se fôssemos um.
Como se a Terra fosse um todo:
água, mato, pedra, animais e gente
e cada gente fosse uma só pessoa
e cada pessoa fosse a Terra.
Como se as lágrimas de uma mulher
fossem choradas por todas elas.
Como se o chão duro;
o frio cortante das madrugadas
dos moradores de rua
nos dilacerasse a carne,
nos magoasse a alma.
como se fôssemos um.
Como se nos humilhasse
o tapa na cara
e machucasse em cada um
os pés calejados de andar descalços
e em todos os estômagos
doesse a dor da fome.
Como se meninas e meninos abandonados
fossem filhas e filhos de todas as
mães.
Como se velhos solitários
fossem avôs e avós de todos nós.
Como se não existissem minorias,
preconceitos, racismo
e tantas outras tolices,
e fossemos de fato gente,
respeitados em nossos direitos.
Como se cada riso
movesse todos os lábios,
como se os olhares tivessem todos
o mesmo brilho afortunado,
como se os corações transbordassem de
esperança
e aprendêssemos todos a estender as
mãos,
assim, como se fôssemos um."
(* Sonia R. Bischain, poema publicado na 'Revista Ruído Manifesto', 06/06/2019)
Pátria Armada
Nenhum comentário:
Postar um comentário