sexta-feira, 8 de abril de 2022

Coletânea Poetas Vivos

 


JOVENS

 Escrevam o que queiram.

 No estilo que lhes pareça melhor.

 Passou demasiado sangue sob as pontes

para continuar-se a crer

que possa seguir-se um só caminho.

 Em poesia tudo é permitido.

 Com a condição expressa

é evidente

de superar-se o papel em branco.

 

Nicanor Parra

Raptado da time line no facebook de Dudu Galisa


A inveja mata

e faz do invejoso
um réptil
sem corpo
nem alma
apenas um réptil venenoso
querendo com sua inveja
me matar
a mim e ao meu amor à poesia

 

Fernanda Villas Boas


"Santos ocupados

 

Implorei a tantos santos,

nem sei qual me socorreu.

Os passos que andei no escuro,

entrando fundo na noite,

amassando muita dor,

que santo viu e virou

contra o escuro luz tão clara

que a noite se amanheceu?

Naquela tarde arranhada

por mil gritos de socorro,

a correria atulhando

as ruas de solidão,

na cara larga do pânico

que santo, que santo veio

e duro nela bateu?

Agora que os pés do medo

avançam sobre meu peito,

esmagam minha alegria,

que santo vê e implora

por mim, encostado em Deus?

Eu pedi a tantos santos...

Estavam muito ocupados

desatando nós do mundo,

curando vastas feridas,

regando no tempo certo

as plantações do meu Deus.

Estavam muito ocupados...

Um deles, porém, deteve-se,

e, oculto, me socorreu!"

 

Oswaldo de Camargo

Dia de Todos os Santos, 2016

Raptado da time line no facebook de Lau Siqueira


UM POEMA DE FABÍOLA LACERDA


essa caixa preta,
o que escondo
de mim?

que parte de mim?
a finitude?
mas qual das mortes?

será que choro,
será que grito,
na caixa preta?

o que não me digo?
essa cegueira
esse mutismo
é triste abismo?

a felicidade da vigília é o que
protejo nessa caixa preta?
ou sua fragilidade?
ou sua inesxistência?

acordo à madrugada
suada, chorando
acordo com estrondo
do bater da tampa
da caixa preta

o que escondo
devo (me) manter
na caixa preta?

 

Fabíola de Lacerda

Raptado da time line no facebook de Claudio Daniel


ESPERAR


Esperamos o outro,
a primavera, uma oferta, uma doação,
o adequado,
a cura,
o fim do jogo,
o próximo ato,
o prêmio da loteria,
o diagnóstico,
Godot.

Esperar, dizem.
O quê — não importa.
Importa como esperamos:
de pé é a melhor maneira.
Esperar em outra posição
encurta a esperança.

Mário Baggio


DONA MAURA

 Os senhores do mundo

Traçam guerra.

Sobre a mesa

Dona Maura faz um bolo.

É quarta-feira

E não existe mais TV.

As bombas caem.

Dona Maura coça as

costas.

 

Daniel Rodas

Raptado da time line no facebook de Angel Cabeza


A uma vampira


Com sua ausência perfumada
De tão noturnos lábios chega,
Passos sem passos que me sorvem
Em sonolenta embriaguez.
Me jogo neste estranho abismo
De sua fria e branca pele.

Seus dentes sorvem minh' ausência
E meu corpo é seu precipício.

Sufoco espelhos em banquete
Do mais ausente e puro branco
E não reflito a sobra deste
Escuro corpo que me veste
Em sua opaca e densa sombra.
Somos o nada do que sou.

Seus dentes sorvem minh' ausência
E meu corpo é seu precipício.

Sua boca sorve o rubro corpo
Que se condensa em minha pele.
Respiro minha sombra opaca
Que cobre os olhos de penhasco
E bebo estranha e rubra dama
Que espalha intensa escuridão.

Seus dentes sorvem minh' ausência
E meu corpo é seu precipício

 

Daniell TW


RITO DO AMOR MORTO


que fazer das minhas mãos
que não lavram mais o sonho,
não jogam a tarrafa de luz da manhã
sobre os quintais do mundo velho,
não desenham a imagem
do ansiado homem novo
não acreditam mais na revolução
que fazer dos meus olhos,
duas minas d'água,
de onde escorrem minhas melhores memórias
Iluminadas, florais.

por fim, que fazer deste amor morto
que trago no colo pra te devolver,
se não te acho mais.
vou deita-lo num barco azul
e solta-lo no cais
na corrente de mar
que leva às geleiras
solitárias, longínquas,
abrigo de corações tombados,
pra nunca mais
pra nunca mais.

 

Fernando Leite Fernandes




 EM 'EME'


Abri a mão em palma:
a linha seguia em 'eme'
até virar ao dorso
(nenhum gesto afoito)
- os dedos ficaram perplexos!
Encontrei sulcos atravessados
avisando-me que a vida anda em percalços:
talvez seja aquele passo em falso,
quando o coração escorrega,
cai de cara no asfalto escuro,
arrebentando veias,
sangrando tristezas armazenadas
em sacolas lacradas.
(Esqueci de dizer que houve um rasgo escuso).
Sem agulha
não sei costurar melancolias estrangeiras
- por isso renego o grito,
a palavra maldita -
prefiro engolir silêncios em seco
do que naufragar profundidades sem solução.

- A água na comporta dos olhos jorrou sem medo pelo desvio padrão costumeiro (e nem era mais tempo de verão).

(Nic Cardeal, em 05.04.2019)

(
 fotografia de Paulo Henrique Camargo Batista, com autorização - todos os direitos reservados)


vem de longe

o cheiro de terra molhada
o canto de pássaro escondido

vem de longe
o ruído do trator
o sol na varanda
a lavoura de algodão

vem de longe
o carrinho de rolemã
o pega-pega no quintal
o recreio na escola

vem de longe
o correio elegante nas quermesses
o beijo no banco da praça

vem de longe
o jeito ingênuo
de levar a vida

vem de longe
a vontade louca
de começar tudo outra vez

vem de longe
vem de longe
tão perto da memória

 

Dinovaldo Gillioli

Pintura: Silvana Oliveira 


ESPELHO D’ÁGUA


Como se estivesse apagando
um texto inteiro. Empurrando
letra por letra para o abismo.

Assim percorro a memória
da minha pele.

Deletando uma verdade
imponderável. Segredos
na sede da alma.

Sem algemas.

Teu nome agora
é Poema.

Na força da Ayahuasca.
É de dentro que o solo
irrompe ou se dissolve.

No mais,
a vida é maneira.

Até a Lua mostra-se inteira
e depois vai minguando
nas sombras...

O que demora para partir
nunca volta. O tempo
é agora.

(...)

Hoje aguei as flores.

Flores tristes em terra
de artifícios.

Tanta água.

Vida doce.
Sede absurda.

Lau Siqueira, poema.
Mariana Siqueira, ilustração.


Jura secreta 17



meu objeto concreto
é um poema abstrato

impressionista realista
quem sabe neo concretista
poderoso artefato

uma bomba de Hiroshima
uma rosa parafina
ou quem sabe uma menina
que conheci só no retrato

 

Jura Secreta 31

 

de Dante a Chico Buarque
todos os poetas
já cantaram suas musas

Beatriz são muitas
Beatriz são quantas
Beatriz são todas
Beatriz são tantas

algumas delas na certa
também já foram cantadas
por este poeta insano e torto
pra lhes trazer o desconforto
do amor quando bandido

Beatriz são nomes
mas este de quem vos falo
não revelo o sobrenome

está no filme sagrado
na pele do acetato
na memória do retrato
Beatriz no último ato
da Divina Comédia Humana
quando deita em minha cama
e come do fruto proibido

 

Jura Secreta 32

fosse apenas o que já foi dito
escrito falado pensado
não fosse tudo o que já foi maldito
e nada do que nunca foi sagrado

falo em tua boca enquanto em transe
um anjo me ilumina tanto
que mesmo mudo em tua língua canto

como um diabo que subindo aos céus
tentou muito mais de uma vez
quem sabe Gregório ou quem sabe Castro
descendo aos infernos como sempre fez

talvez Camões no corpo de um astro
me lance a infinita chama da pornô Gráfica lucidez

 

Jura Secreta 33
sampleAndo

o poema pode ser
um beijo em tua boca
carne de maçã em maio
um tiro oculto sob o céu aberto
estrelas de néon em Vênus
refletindo pregos no meu peito em cruz

na Paulista Consolação
na Água Branca Barra Funda
metal de prata desta lua que me inunda
num beijo sujo com uma Estação da Luz

nos vídeos.filmes de TV
eu quero um clipe nos teus seios quentes
uma cilada em tuas coxas japa
como uma flecha em tuas costas índia
ninja gueixa eu quero a rota teu país ou mapa

teu território devastar inteiro
como uma vela ao mar de fevereiro
molhar teu cio e me esquecer na Lapa

 

Jura secreta 29
esfinge

o amor
não é apenas um nome
que anda por sobre a pele
um dia falo letra por letra
no outro calo fome por fome
é que a pele do teu nome
consome a flor da minha pele

cravado espinho na chaga
como marca cicatriz
eu sou ator ela esfinge:
Clarice/Beatriz:

assim vivemos cantando
fingindo que somos decentes
para esconder o sagrado
em nossos profanos segredos
se um dia falta coragem
a noite sobra do medo

é que na sombra da tatuagem
sinal enfim permanente
ficou pregando uma peça
em nosso passado presente

o nome tem seus mistérios que
se escondem sob panos
o sol é claro quando não chove
o sal é bom quando de leve
para adoçar desenganos
na língua na boca na neve

o mar que vai e vem não tem volta
o amor é a coisa mais torta
que mora lá dentro de mim
teu céu da boca é a porta
onde o poema não tem fim


Artur Gomes

do livro Juras Secretas

Editora Penalux – 2018

www.secretasjuras.blogspot.com



Oficina Fotografia e Produção Cine Vídeo

Direção: Artur Gomes – Dias: Sábados das 15 às 17h – Previsão para iniciar em junho - Inscrições na Ong Beija Flor – Casa da Solidariedade – Rua Ari Parreira, 26 – Barra Velha – Gargaú – São Francisco do Itabapoana-RJ – 28230-000

e continua a campanha para doações de livros para a Biblioteca Bracutaia que será inaugurada dia 1º de Maio.

clic no link para ver ovídeo 

https://www.youtube.com/watch?v=vJ4I_oM1U3A&t=151s


 

Fulinaíma MultiProjetos

www.centrodeartefulinaima.blogspot.com

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Live em homenagem a Antônio Cícero

No próximo dia 23 às 16:hs à convite da minha amiga  Renata Barcellos BarcellArtes  estaremos nessa live em homenagem a memória de  Antônio ...