FICA DECRETADO QUE O NOME E A POESIA DE THIAGO DE MELLO NUNCA e JAMAIS FICARÃO ATRELADOS AOS PENSAMENTOS CONTRÁRIOS AOS DIREITOS HUMANOS
Caros Amigos,
Vem circulando na Internet, de forma acintosa, pois sem
nenhuma solicitação e permissão dos Direitos Autorais do Artista, a imagem do
poeta Thiago de Mello, meu Pai, num evento literário “on line” no dia 13 de
abril ao lado de um escritor, que me recuso a escrever o nome, assim como a
Sociedade Organizadora, uma vez que têm postura fascista, nazista, a favor de
tortura.
Isto é um
descalabro!
Uma afronta e um desrespeito para com a vida e a obra de
Thiago de Mello, um jornalista que defendeu com a própria vida seus valores de
respeito e dignidade para com o ser humano. Minha mãe e meu pai lutaram pela
democracia depois do golpe-civil-militar de 1964 e por isso foram perseguidos,
presos, exilados por um governo de ditadura que desaparecia, matava e torturava
jornalistas, médicos, políticos, professores, todos aqueles que comungavam com
ideais de uma sociedade solidária, que dividisse terras e fizesse reforma agrária.
Que as indústrias dividissem lucros com os operários. Dividir? Os livros de papai FAZ ESCURO MAS EU CANTO e
A CANÇÃO DO AMOR ARMADO foram queimados pela ditadura. Eu com três aninhos de
idade, no colo de mamãe Lourdinha passei por um corredor de metralhadoras.
Tentando refúgio na Embaixada, Thiago e Manduka, meu irmão mais velho foram
detidos por militares que perguntaram um pro outro: - “Mata aqui mesmo?” O tiro
não veio. Sobrevivemos.
Já estamos tomando todas as medidas cabíveis para a retirada
do nome, da imagem e dos poemas do poeta Thiago de Mello em tal evento. Como se
não bastasse a dor da partida, ter que lidar com o "aviso" de que OS
ESTATUTOS DO HOMEM será lido por quem faz apologia ao nazismo. Não é possível permitir que a filosofia da
Ditadura e da Tortura homenageie Thiago.
Aliás, parece que este tipo de cara-de-pau está na ordem do
dia: recentemente a Medalha de Mérito Indigenista foi entregue a uma turma de
Ministros e ao Presidente, que, incentivam o garimpo a invadir as terras
indígenas e que vetaram, em plena pandemia, a distribuição de água potável nas
mesmas terras indígenas. Vou parafrasear o jornalista José Ribamar Bessa Freire
que nos deu esta notícia no seu Jornal Eletrônico TAQUIPRATI: “Essas medalhas –
e essa homenagem ao poeta – são como as flores enviadas ao velório dos índios
por seus algozes”.
Isabella
Thiago de Mello.
Manaus, 04 de Abril de 2022
Fica
decretado que, a partir deste instante,
haverá girassóis em todas as janelas,
que os girassóis terão direito
a abrir-se dentro da sombra;
e que as janelas devem permanecer, o dia inteiro,
abertas para o verde onde cresce a esperança.
Para os que
Virão
Como sei pouco, e sou pouco,
faço o pouco que me cabe
me dando inteiro.
Sabendo que não vou ver
o homem que quero ser.
Já sofri o suficiente
para não enganar a ninguém:
principalmente aos que sofrem
na própria vida, a garra
da opressão, e nem sabem.
Não tenho o sol escondido
no meu bolso de palavras.
Sou simplesmente um homem
para quem já a primeira
e desolada pessoa
do singular - foi deixando,
devagar, sofridamente
de ser, para transformar-se
- muito mais sofridamente -
na primeira e profunda pessoa
do plural.
Não importa que doa: é tempo
de avançar de mão dada
com quem vai no mesmo rumo,
mesmo que longe ainda esteja
de aprender a conjugar
o verbo amar.
É tempo sobretudo
de deixar de ser apenas
a solitária vanguarda
de nós mesmos.
Se trata de ir ao encontro.
(Dura no peito, arde a límpida
verdade dos nossos erros.)
Se trata de abrir o rumo.
Os que virão, serão povo,
e saber serão, lutando.
As Ensinanças
da Dúvida
Tive um chão (mas já faz tempo)
todo feito de certezas
tão duras como lajedos.
Agora (o tempo é que fez)
tenho um caminho de barro
umedecido de dúvidas.
Mas nele (devagar vou)
me cresce funda a certeza
de que vale a pena o amor.
Faz
escuro mas eu canto,
porque a manhã vai chegar.
Vem ver comigo, companheiro,
a cor do mundo mudar.
Vale a pena não dormir para esperar
a cor do mundo mudar.
Já é madrugada,
vem o sol, quero alegria,
que é para esquecer o que eu sofria.
Quem sofre fica acordado
defendendo o coração.
Vamos juntos, multidão,
trabalhar pela alegria,
amanhã é um novo dia.
A Fruta Aberta
Agora sei quem sou.
Sou pouco, mas sei muito,
porque sei o poder imenso
que morava comigo,
mas adormecido como um peixe grande
no fundo escuro e silencioso do rio
e que hoje é como uma árvore
plantada bem alta no meio da minha vida.
Agora sei as coisa como são.
Sei porque a água escorre meiga
e porque acalanto é o seu ruído
na noite estrelada
que se deita no chão da nova casa.
Agora sei as coisas poderosas
que valem dentro de um homem.
Aprendi contigo, amada.
Aprendi com a tua beleza,
com a macia beleza de tuas mãos,
teus longos dedos de pétalas de prata,
a ternura oceânica do teu olhar,
verde de todas as cores
e sem nenhum horizonte;
com tua pele fresca e enluarada,
a tua infância permanente,
tua sabedoria fabulária
brilhando distraída no teu rosto.
Grandes coisas simples aprendi contigo,
com o teu parentesco com os mitos mais terrestres,
com as espigas douradas no vento,
com as chuvas de verão
e com as linhas da minha mão.
Contigo aprendi
que o amor reparte
mas sobretudo acrescenta,
e a cada instante mais aprendo
com o teu jeito de andar pela cidade
como se caminhasses de mãos dadas com o ar,
com o teu gosto de erva molhada,
com a luz dos teus dentes,
tuas delicadezas secretas,
a alegria do teu amor maravilhado,
e com a tua voz radiosa
que sai da tua boca
inesperada como um arco-íris
partindo ao meio e unindo os extremos da vida,
e mostrando a verdade
como uma fruta aberta.
Thiago de
Mello
(Sobrevoando a Cordilheira dos Andes, 1962)
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