quarta-feira, 20 de abril de 2022

Coletânea Poetas Vivos


  DA TERRA

 

Depois de tudo,

um esforço vão

no destempero de viver

aos avessos?

Não creio.

Há de haver algum outro meio

de se viver sem solavancos,

de apartar minhas estacas,

de segurar a alma intacta.

E o meu medo da terra

caída sobre o dorso

do que antes fora

minha vida?

Não creio

que do pó vindo

volverei ao pó dos findos.

Algo há que me fazer refeita,

'inda que de mim desfeita

sobre um sopro voejando ao largo

n'outros vastos

algures mais amplos

infindáveis relâmpagos

sem me perder

de mim solidão rendida.

Que a terra não me faça promessas

nunca cumpridas,

antes me guarde intacta

na semente outra vez parida.


Nic Cardeal/2018


Boa tarde, pessoal. Meu novo livro de poesia, VIRAÇÃO, entrou em pré-venda hoje. Para adquirir um exemplar, basta acessar o link da brava Editora Patuá, que está logo abaixo.


Este livro, que se divide em três partes, fala principalmente da história de personagens importantes para a construção e reconstrução da cidade de Santo Estêvão e, por essa razão, o livro se confunde com a história e a biografia desta cidade.

VIRAÇÃO é um livro que fala também do sertão, da seca, da fome, da morte e da vida. Um livro sobre a geografia e a história dum sertão que eu, desde pequeno, vi nas vozes e na carne de dezenas de homens e mulheres que sobreviviam daquilo que a terra lhes dava. VIRAÇÃO é um livro sobre vaqueiros, parteiras, rezadeiras, a terra, os rios, sambadeiras, carpinteiros, costureiras, mãe de santo, ancestrais.


 Fabrício Oliveira

https://www.editorapatua.com.br/produto/261727/viracao-de-fabriciooliveira?fbclid=IwAR2k13ujj2l9FaE8A22w5DUlUdFaT3sUdH5HCt3_0a9z9NPIsri1Krbto0s



19 de abril: Dia de Luta dos povos indígenas


A palavra “mitologia” tem dois sentidos: 1- conjunto dos mitos produzidos por um povo ( e não apenas pelo povo grego); 2- estudo dos mitos. Infelizmente, nenhum desses dois sentidos traduz a experiência originária dos povos que viveram e criaram os mitos, pois são sentidos teóricos nascidos bem depois daquela experiência concreta e originária.

Devido ao desconhecimento dessa experiência originária com o sentido da vida e da existência , muitos hoje desdenham da mitologia, e consideram que é mais “útil” ensinar aos jovens “cartilhas” e “tabuadas” que adestrem para aquilo que o mercado exige.

Assim, “mitologia” ou “mito” não são bons nomes para designar a experiência originária que vários povos fizeram, e fazem, para darem sentido à existência pessoal e coletiva. Em vez de “mitologia” ou “mito”, prefiro empregar o termo “empoemamento originário”.

É Manoel de Barros quem ensina que poesia não é só escrever rimas e versos, pois poesia é, antes de tudo, experiência de empoemamento.
Empoemar-se não é apenas ler versos, empoemar-se tampouco é somente contemplar o que é “belo”.

“Poesia” vem de um verbo grego que significa “produção”. Assim, empoemar-se é produzir a si mesmo agenciado com o outro, com o mundo, com o cosmos. Empoemar-se é o contrário do anular-se .

Empoemar é um verbo que se conjuga em todos os tempos, em plurais modos e em todas as pessoas do singular e do plural. Empoemar-se também é ação clínica, política , ética e pedagógica.

Sob essa perspectiva , a experiência originária que gerou os mitos não está apenas no passado . O sentido de se ler os mitos hoje é para fazer reviver em nós, aqui e agora, aquela experiência. Não para que repitamos o que Homero e Hesíodo disseram, mas para que possamos (re)aprender a produzir sentidos que repotencializem a vida com força regeneradora e criativa.

Não apenas os gregos fizeram essa experiência com a poesia originária, nossos povos indígenas também o fizeram e perseverantemente ainda o fazem para se manterem vivos.

Segundo Krenak, o poeta da tribo tem o seguinte nome: “pessoa coletiva”. O poeta da tribo trava batalhas diferentes daquelas que os guerreiros travam; ele exerce um tipo de poder mais poderoso do que o do cacique; e promove curas ainda mais necessárias à vida da tribo do que as curas do pajé.

Com suas narrativas originárias, o poeta da tribo empoema a coletividade e evoca a força dos ancestrais para que as florestas de Pindorama resistam de pé plenas de vida . Com sua palavra geradora , o poeta da tribo age para adiar o fim do mundo...

Até fascistas às vezes são chamados de “mito”... Porém é sempre libertária a experiência originária que empoema a existência e a fortalece frente a tudo aquilo que , ontem e hoje, a põe sob risco.

“A literatura é o esforço para interpretar engenhosamente os mitos
que não mais se compreende, por não sabermos mais sonhá-los ou produzi-los.”(Deleuze)


Elton Luiz Leite de Souza  



Confiança


O oceano separou-me de mim
enquanto me fui esquecendo nos séculos
e eis-me presente
reunindo em mim o espaço
condensando o tempo

Na minha história

existe o paradoxo do homem disperso

Enquanto o sorriso brilhava

no canto de dor
e as mãos construíram mundos maravilhosos

John foi linchado

o irmão chicoteado nas costas nuas
a mulher amordaçada
e o filho continuou ignorante

E do drama intenso

duma vida imensa e útil
resultou certeza

As minhas mãos colocaram pedras

nos alicerces do mundo
mereço o meu pedaço de pão.


- Agostinho Neto (1949), em "Sagrada esperança".


O dia que Fernando Pessoa tomou um porre comigo


Em mesas de botecos líricos
em quartos de tempos imensuráveis
Conto os dias de uma contagem infinita
De sentir o que não se deve sonhar

Não quero parar de amar
Tomo outra dose de cachaça
olho diretamente para você
aí sentada no balcão

Não saia derrotada
deboche
jogue o copo na minha cara

Seu tempo é agora
veja
a negra fama da minha alma

Fernando Pessoa uma vez
me disse não saber quantas almas tinha
pois cada momento o mudou
e o próprio tempo também

Falou ainda que continuamente
se estranhava e nunca se viu
ou de trejeitos se achou
Fui mais além.

Daniel Perroni Ratto


As Vitrines

 

Eu te vejo sumir por aí

Te avisei que a cidade era um vão

- Dá tua mão

- Olha pra mim

- Não faz assim

- Não vai lá não

 

Os letreiros a te colorir

Embaraçam a minha visão

Eu te vi suspirar de aflição

E sair da sessão, frouxa de rir

 

Já te vejo brincando, gostando de ser

Tua sombra a se multiplicar

Nos teus olhos também posso ver

As vitrines te vendo passar

 

Na galeria, cada clarão

É como um dia depois de outro dia

Abrindo um salão

Passas em exposição

Passas sem ver teu vigia

Catando a poesia

Que entornas no chão

 

Chico Buarque

clic no link para ver o vídeo

https://www.youtube.com/watch?v=nzZybLAs3V8



A p e t i t e

para Marceli A. Becker

 

basta o desgastante falar das maturações

do tempo do verbo que nunca alcança

 

tez algodoada de um azul inquebrantável

onde a palavra é lúcida e a poesia é mansa

 

que o fruto ainda verde caia sobre as mãos

em um só sentido, uníssono e irreversível

desfazendo-se em grãos ao puir nos dentes

 

e confronte a etérea solombra atmosférica

com toda a força desgarrada das urgências

interrompendo o tempo sacro da semente

 

bendita seja a palavra daquilo que se consome

bendita a rebelião do lado de dentro da fome

 

Amanda Vital

Do livro Passagem

Editora Patuá – 2018



A guerra de Troia

 

Helena me traiu

por um copo de cerveja

no réveillon de 2004

pra bem dizer

pra bem fazeja

naquele sítio de Ernesto

ela sabia que eu não presto

não foi por falta de aviso

ou foi tamanho o seu desejo

que não recusou fugir comigo

mas percebeu tanto perigo

e então brochou

sentiu o medo na medula no pescoço

calou a boca para o beijo

e resolveu seguir a mãe

e apanhar do seu marido

 

Federico Baudelaire

www.arturkabrunco.blogspot.com 



 Fricção

 

quem passou a língua

mas coxas da Caipora?

me pergunta Federico Baudelaire

cheirando as Flores d0  Mal

no Sarau de EuGênio Mallarmè

 

Gigi então invoca

a Dona Santa Federika

que baixa na mesma hora

 

- ora bolas fui eu

com minha língua de faca

cortei a cara da vaca

a começar pelas coxas

depois subi pelo corpo

até o buraco da boca

e meti a língua na língua

 

e na suruba das línguas

a dela mordendo a minha

a minha mordendo a dela

a Arte então se revela

não existe Arte sem língua

nem Teatro sem linguagem

a Arte é uma grande suruba

e o resto mais é paisagem

 

Federika Bezerra

www.personasarturianas.blogspot.com




mar de búzios

mel de ostras

minha cabeça parafuso

 

no fundo da xícara

na borra do café teu nome

o sobrenome na asa

a brasa morde meus dias

de outono quente

e as noites que dormi na tua casa

um pássaro canta na janela

quando toco tua coxa

Florbela não soube me dizer

porque vaza sob meus pés

um rio das ostras

 

Artur Gomes

poema freudelérico

www.fulinaimagemfreudelerico.blogspot.com




Artur Gomes, poeta, ator, videomaker e produtor cultural, é o convidado da 20ª. edição do Canal do Poetariado que acontece 2ª. feira, dia 25 de abril 20h. Nessa edição, comandada por Cesar Augusto de Carvalho e Hamilton Faria, o bate-papo poético terá a participação dos poetas Tchello d´Barros e Ademir Assunção.

 Artur Gomes tem 17 livros de poesia publicados, - seu livro Pátria A®mada ganhou o Prêmio Oswald de Andrade (UBE/RIO 2020) e sua segunda edição, ampliada e revisada, tem lançamento previsto para este ano.

É criador de importantes projetos culturais, tais como a Mostra Visual de Poesia Brasileira, (1983) e Retalhos Imortais do SerAfim – Oswald de Andrade Nada Sabia de Mim, realizado em 1995 pelo SESC_SP, dentre outros.

Seu mais novo projeto, em andamento, é Por Onde Andará Macunaíma? uma releitura multilinguagem antropofágica da Semana De Arte Moderna de 1922 e é o responsável pelo Projeto de Arte Cultura na ONG Beija Flor – Casa da Solidariedade – em Gargaú – São Francisco do Itabapoana-RJ.

Como comentarista de sua obra, Artur convidou o poeta e artista multimidia, Tchello d´Barros. Natural de Santa Catarina, deambulou por 20 países, morou em 15 cidades e realizou atividades culturais em todos os estados brasileiros. Além dos 7 livros de poemas que publicou, seus contos, crônicas, artigos, ensaios e poemas foram publicados em cerca de 100 coletâneas, antologias e livros didáticos.

Para homenagear Oswald de Andrade, Artur Gomes convidou Ademir Assunção, poeta, escritor, jornalista e letrista de música brasileira. Autor de livros de poesia, ficção e jornalismo, venceu como o melhor livro de poesia do ano, o Prêmio Jabuti 2013, com A Voz do Ventríloquo. Pig Brother, o livro seguinte, ficou entre os finalistas do Prêmio Jabuti 2016.

Formado em jornalismo pela Universidade Estadual de Londrina, trabalhou como repórter e editor nos jornais Folha de Londrina, O Estado de S. Paulo, Jornal da Tarde, Folha de S. Paulo e na revista Marie Claire. Co-editou as revistas literárias K’an e Coyote, junto com os poetas Marcos Losnak e Rodrigo Garcia Lopes.

Para não perder este bate-papo acesse o link

https://youtu.be/qyCSwzGZ9lk

Agende-se.

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Bom programa!

 

Cesar Augusto de Carvalho



Fualinaíma MultiProjetos

www.centrodeartefulinaima.blogspot.com

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