DA TERRA
Depois de tudo,
um esforço vão
no destempero de viver
aos avessos?
Não creio.
Há de haver algum outro meio
de se viver sem solavancos,
de apartar minhas estacas,
de segurar a alma intacta.
E o meu medo da terra
caída sobre o dorso
do que antes fora
minha vida?
Não creio
que do pó vindo
volverei ao pó dos findos.
Algo há que me fazer refeita,
'inda que de mim desfeita
sobre um sopro voejando ao largo
n'outros vastos
algures mais amplos
infindáveis relâmpagos
sem me perder
de mim solidão rendida.
Que a terra não me faça promessas
nunca cumpridas,
antes me guarde intacta
na semente outra vez parida.
Nic Cardeal/2018
Boa tarde, pessoal. Meu novo livro de poesia, VIRAÇÃO, entrou em pré-venda hoje. Para adquirir um exemplar, basta acessar o link da brava Editora Patuá, que está logo abaixo.
Este livro, que se divide em três partes, fala
principalmente da história de personagens importantes para a construção e
reconstrução da cidade de Santo Estêvão e, por essa razão, o livro se confunde
com a história e a biografia desta cidade.
VIRAÇÃO é um livro que fala também do sertão, da
seca, da fome, da morte e da vida. Um livro sobre a geografia e a história dum
sertão que eu, desde pequeno, vi nas vozes e na carne de dezenas de homens e
mulheres que sobreviviam daquilo que a terra lhes dava. VIRAÇÃO é um livro
sobre vaqueiros, parteiras, rezadeiras, a terra, os rios, sambadeiras,
carpinteiros, costureiras, mãe de santo, ancestrais.
19 de abril: Dia de Luta dos povos indígenas
A palavra “mitologia” tem dois sentidos: 1-
conjunto dos mitos produzidos por um povo ( e não apenas pelo povo grego); 2-
estudo dos mitos. Infelizmente, nenhum desses dois sentidos traduz a
experiência originária dos povos que viveram e criaram os mitos, pois são
sentidos teóricos nascidos bem depois daquela experiência concreta e originária.
Devido ao desconhecimento dessa experiência originária com o sentido da
vida e da existência , muitos hoje desdenham da mitologia, e consideram que é
mais “útil” ensinar aos jovens “cartilhas” e “tabuadas” que adestrem para
aquilo que o mercado exige.
Assim, “mitologia” ou “mito” não são bons nomes para designar a
experiência originária que vários povos fizeram, e fazem, para darem sentido à
existência pessoal e coletiva. Em vez de “mitologia” ou “mito”, prefiro
empregar o termo “empoemamento originário”.
É Manoel de Barros quem ensina que poesia não é só escrever rimas e
versos, pois poesia é, antes de tudo, experiência de empoemamento.
Empoemar-se não é apenas ler versos, empoemar-se
tampouco é somente contemplar o que é “belo”.
“Poesia” vem de um verbo grego que significa “produção”. Assim,
empoemar-se é produzir a si mesmo agenciado com o outro, com o mundo, com o
cosmos. Empoemar-se é o contrário do anular-se .
Empoemar é um verbo que se conjuga em todos os tempos, em plurais modos
e em todas as pessoas do singular e do plural. Empoemar-se também é ação
clínica, política , ética e pedagógica.
Sob essa perspectiva , a experiência originária que gerou os mitos não
está apenas no passado . O sentido de se ler os mitos hoje é para fazer reviver
em nós, aqui e agora, aquela experiência. Não para que repitamos o que Homero e
Hesíodo disseram, mas para que possamos (re)aprender a produzir sentidos que
repotencializem a vida com força regeneradora e criativa.
Não apenas os gregos fizeram essa experiência com a poesia originária,
nossos povos indígenas também o fizeram e perseverantemente ainda o fazem para
se manterem vivos.
Segundo Krenak, o poeta da tribo tem o seguinte nome: “pessoa coletiva”.
O poeta da tribo trava batalhas diferentes daquelas que os guerreiros travam;
ele exerce um tipo de poder mais poderoso do que o do cacique; e promove curas
ainda mais necessárias à vida da tribo do que as curas do pajé.
Com suas narrativas originárias, o poeta da tribo empoema a coletividade
e evoca a força dos ancestrais para que as florestas de Pindorama resistam de
pé plenas de vida . Com sua palavra geradora , o poeta da tribo age para adiar
o fim do mundo...
Até fascistas às vezes são chamados de “mito”... Porém é sempre
libertária a experiência originária que empoema a existência e a fortalece
frente a tudo aquilo que , ontem e hoje, a põe sob risco.
“A literatura é o esforço para interpretar
engenhosamente os mitos
que não mais se compreende, por não sabermos mais
sonhá-los ou produzi-los.”(Deleuze)
Elton Luiz Leite de Souza
Confiança
O oceano separou-me de mim
enquanto me fui esquecendo nos séculos
e eis-me presente
reunindo em mim o espaço
condensando o tempo
Na minha história
existe o paradoxo do homem disperso
Enquanto o sorriso brilhava
no canto de dor
e as mãos construíram mundos maravilhosos
John foi linchado
o irmão chicoteado nas costas nuas
a mulher amordaçada
e o filho continuou ignorante
E do drama intenso
duma vida imensa e útil
resultou certeza
As minhas mãos colocaram pedras
nos alicerces do mundo
mereço o meu pedaço de pão.
- Agostinho Neto (1949), em
"Sagrada esperança".
O dia que Fernando Pessoa tomou um porre comigo
Em mesas de botecos líricos
em quartos de tempos imensuráveis
Conto os dias de uma contagem infinita
De sentir o que não se deve sonhar
Não quero parar de amar
Tomo outra dose de cachaça
olho diretamente para você
aí sentada no balcão
Não saia derrotada
deboche
jogue o copo na minha cara
Seu tempo é agora
veja
a negra fama da minha alma
Fernando Pessoa uma vez
me disse não saber quantas almas tinha
pois cada momento o mudou
e o próprio tempo também
Falou ainda que continuamente
se estranhava e nunca se viu
ou de trejeitos se achou
Fui mais além.
Daniel Perroni Ratto
As Vitrines
Eu te vejo sumir por aí
Te avisei que a cidade era um vão
- Dá tua mão
- Olha pra mim
- Não faz assim
- Não vai lá não
Os letreiros a te colorir
Embaraçam a minha visão
Eu te vi suspirar de aflição
E sair da sessão, frouxa de rir
Já te vejo brincando, gostando de ser
Tua sombra a se multiplicar
Nos teus olhos também posso ver
As vitrines te vendo passar
Na galeria, cada clarão
É como um dia depois de outro dia
Abrindo um salão
Passas em exposição
Passas sem ver teu vigia
Catando a poesia
Que entornas no chão
Chico
Buarque
clic no
link para ver o vídeo
https://www.youtube.com/watch?v=nzZybLAs3V8
A p e t i t e
para Marceli A. Becker
basta o desgastante falar das maturações
do tempo do verbo que nunca alcança
tez algodoada de um azul inquebrantável
onde a palavra é lúcida e a poesia é mansa
que o fruto ainda verde caia sobre as mãos
em um só sentido, uníssono e irreversível
desfazendo-se em grãos ao puir nos dentes
e confronte a etérea solombra atmosférica
com toda a força desgarrada das urgências
interrompendo o tempo sacro da semente
bendita seja a palavra daquilo que se consome
bendita a rebelião do lado de dentro da fome
Amanda
Vital
Do livro Passagem
Editora Patuá – 2018
Helena me traiu
por um copo de cerveja
no réveillon de 2004
pra bem dizer
pra bem fazeja
naquele sítio de Ernesto
ela sabia que eu não presto
não foi por falta de aviso
ou foi tamanho o seu desejo
que não recusou fugir comigo
mas percebeu tanto perigo
e então brochou
sentiu o medo na medula no pescoço
calou a boca para o beijo
e resolveu seguir a mãe
e apanhar do seu marido
Federico
Baudelaire
www.arturkabrunco.blogspot.com
Fricção
quem passou a língua
mas coxas da Caipora?
me pergunta Federico Baudelaire
cheirando as Flores d0
Mal
no Sarau de EuGênio Mallarmè
Gigi então invoca
a Dona Santa Federika
que baixa na mesma hora
- ora bolas fui eu
com minha língua de faca
cortei a cara da vaca
a começar pelas coxas
depois subi pelo corpo
até o buraco da boca
e meti a língua na língua
e na suruba das línguas
a dela mordendo a minha
a minha mordendo a dela
a Arte então se revela
não existe Arte sem língua
nem Teatro sem linguagem
a Arte é uma grande suruba
e o resto mais é paisagem
Federika
Bezerra
www.personasarturianas.blogspot.com
mar de búzios
mel de ostras
minha cabeça parafuso
no fundo da xícara
na borra do café teu nome
o sobrenome na asa
a brasa morde meus dias
de outono quente
e as noites que dormi na tua casa
um pássaro canta na janela
quando toco tua coxa
Florbela não soube me dizer
porque vaza sob meus pés
um rio das ostras
Artur
Gomes
poema freudelérico
www.fulinaimagemfreudelerico.blogspot.com
Artur Gomes tem 17 livros de poesia publicados, - seu livro Pátria A®mada ganhou o Prêmio Oswald de Andrade (UBE/RIO 2020) e sua segunda edição, ampliada e revisada, tem lançamento previsto para este ano.
É criador de importantes projetos culturais, tais como a Mostra
Visual de Poesia Brasileira, (1983) e Retalhos Imortais do SerAfim – Oswald de
Andrade Nada Sabia de Mim, realizado em 1995 pelo SESC_SP, dentre outros.
Seu mais novo projeto, em andamento, é Por Onde Andará
Macunaíma? uma releitura multilinguagem antropofágica da Semana De Arte Moderna
de 1922 e é o responsável pelo Projeto de Arte Cultura na ONG Beija Flor – Casa
da Solidariedade – em Gargaú – São Francisco do Itabapoana-RJ.
Como comentarista de sua obra, Artur convidou o poeta e artista
multimidia, Tchello d´Barros. Natural de Santa Catarina, deambulou por 20
países, morou em 15 cidades e realizou atividades culturais em todos os estados
brasileiros. Além dos 7 livros de poemas que publicou, seus contos, crônicas,
artigos, ensaios e poemas foram publicados em cerca de 100 coletâneas,
antologias e livros didáticos.
Para homenagear Oswald de Andrade, Artur Gomes convidou Ademir
Assunção, poeta, escritor, jornalista e letrista de música brasileira. Autor de
livros de poesia, ficção e jornalismo, venceu como o melhor livro de poesia do
ano, o Prêmio Jabuti 2013, com A Voz do Ventríloquo. Pig Brother, o livro
seguinte, ficou entre os finalistas do Prêmio Jabuti 2016.
Formado em jornalismo pela Universidade Estadual de Londrina,
trabalhou como repórter e editor nos jornais Folha de Londrina, O Estado de S.
Paulo, Jornal da Tarde, Folha de S. Paulo e na revista Marie Claire. Co-editou
as revistas literárias K’an e Coyote, junto com os poetas Marcos Losnak e
Rodrigo Garcia Lopes.
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Bom programa!
Cesar Augusto de Carvalho
Fualinaíma MultiProjetos
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