quinta-feira, 11 de janeiro de 2024

múltiplas poéticas

 Múltiplas Poéticas

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https://porradalirica.blogspot.com/


 

A ARTE DOS ESPELHOS

O contrário
impresso
em mistério
espesso

reflete
o vácuo,
dote
do oco,

responde
à imagem,
expande a vertigem,

o inverso
converte
ao reverso
da arte

nova matriz
da sombra,
outra tez da obra,

cristal do corpo,
lúmen,
pericarpo
e sêmen. 

 

Cleber Pacheco 


POEMA DE SOPHIA DE MELLO BREYNER ANDRESEN

 

Eis-me

Tendo-me despido de todos os meus mantos

Tendo-me separado de adivinhos mágicos e deuses

Para ficar sozinha ante o silêncio

Ante o silêncio e o esplendor da tua face

Mas tu és de todos o ausente o ausente

Nem o teu ombro me nem a tua mão me toca

O meu coração desce as escadas do tempo

(em que não moras)

E o teu encontro

São planícies e planícies de silêncio

 

Escura é a noite

Escura e transparente

Mas o teu rosto está para além do tempo opaco

E eu não habito os jardins do teu silêncio

Porque tu és de todos os ausentes o ausente


injúria secreta

 

Suassuna no teu corpo

couro de cor compadecida

Ariano sábio e louco

inaugura em mim a vida

 

Pedra do Reino no riacho

gumes de atalhos na pedreira

menina dos brincos de pérola

pétala na mola do moinho

palavra acesa na fogueira

 

pós os ismos tudo e pós na pele ou nas aranhas

na carne ou nos lençóis no palco ou no cinema

 

a palavra que procuro é clara quando não é gema

até furar os meus olhos com alguma cascata de luz

 

devassa em mim quando transcende

lamparina que acende

e transforma em mel  o que antes era pus

 

Artur Gomes

www.arturgumes.blogspot.com


Doação de livros para a Biblioteca do Povo de Rua do Pe. Júlio

Marcelo Brettas

Anuncio com imensa alegria que na manhã dessa terça (16/01/2024) defini com o querido Pe. Júlio Lancellotti os detalhes para a criação de uma biblioteca para atender os cidadãos e cidadãs que hoje estão relegados à situação de moradia nas ruas. Acompanho as atividades do Pe. Júlio e sei da importância de seu trabalho na tentativa de suprir as necessidades emergenciais de alimentação, vestuário, higiene e moradia, além de resolver uma série de outras questões, como documentação, apoio jurídico, médico e hoje ainda provendo a manutenção de uma padaria própria voltada a doar ao Povo de Rua e de cursos técnicos de costura e informática.


Desde o lançamento de meu livro “Rua qualquer, sem número” uma frase do Pe. Júlio martela a minha cabeça: “eles precisam de livros”. Naquela época o suporte do ProAC me permitiu doar 400 exemplares daquele livro para serem distribuídos entre os moradores em situação de rua. Agora o projeto é mais ambicioso. Junto com Pe. Júlio pretendemos receber a doação de 10 mil livros (prosa, poesia e infantil) nos próximos 30 dias. Eu disponibilizarei perto de mil livros de meu acervo pessoal, o Eduardo Lacerda (da Editora Patuá) já se comprometeu a doar outros mil exemplares e conto com a colaboração de cada um de vocês.
Como a sede da Pastoral do Povo de Rua já está abarrotada com o recebimento e gerenciamento das doações tradicionais, estaremos coletando as doações em endereços alternativos. 

O primeiro ponto de coleta habilitado é a Livraria Patuscada - R. Luís Murat, 40 - Pinheiros, São Paulo - SP, 05436-050

Conto com a divulgação e o apoio de todos!




                    CONSOLO NA PRAIA


Vamos, não chores...
A infância está perdida.
A mocidade está perdida.
Mas a vida não se perdeu.

O primeiro amor passou.
O segundo amor passou.
O terceiro amor passou.
Mas o coração continua.

Perdeste o melhor amigo.
Não tentaste qualquer viagem.
Não possuis casa, navio, terra.
Mas tens um cão.

Algumas palavras duras,
em voz mansa, te golpearam.
Nunca, nunca cicatrizam.
Mas, e o 'humour'?

A injustiça não se resolve.
À sombra do mundo errado
murmuraste um protesto tímido.
Mas virão outros.

Tudo somado, devias
precipitar-te, de vez, nas águas.
Estás nu na areia, no vento...
Dorme, meu filho.
.
Carlos Drummond de Andrade

in "A Rosa do Povo" 


TUDO A VER

 

César Augusto de Carvalho

 Há coisas malucas que acontecem com a gente. Malucas mesmo. Não se encontra explicação.

 Outro dia recebi mensagem de um amigo pedindo-me o endereço. Queria mandar algo que me pertencia. Um livro, claro, pensei.

 Não. Não era um livro. Ao abrir o envelope me deparei com uma plaqueta, o poema da plaqueta datilografado e um texto sobre meu cartão postal, que publiquei em 1986, chamado “Tudo a Ver”. Ambos, o poema e o comentário, com dedicatória da autora, a Hygia Therezinha Calmon Ferreira, à época, 1988, era, além de contista e ensaista, professora da Unesp de São José do Rio Preto.

 Fiquei curioso. Como esse material foi para na mão desse meu amigo? Emprestado eu não tinha. Coisas muito pessoais jamais empresto. Melhor foi perguntar e a resposta foi mais intrigante ainda, ele encontrou no meio de um livro comprado num sebo na Zona Leste, há muitos anos! Só agora, quando resolveu lê-lo encontrou o material e me devolveu.

 A curiosidade morre aqui. Jamais descobrirei o que fiz para colocar itens material tão pessoais no meio de um livro que depois seria vendido num sebo. E vendido não por mim, pois nunca vendo livros para sebo, prefiro doar ou presentear os amigos, mas por um desconhecido.



Ode ao clitóris

impulsivo, criador
mestre e doutarado do amor
esparge doces clemências
em fêmeas com ausências

guardador de flores amorosas
arrebanha amores sem falos

generoso, atrevido
indutor da libido
doce pecador
de fêmeas em ardências
de múltiplos orgasmos
sem evidências...

..

oh! Santa Mãe
desmaio no inferno dantesco
desperto no Nirvana burlesco
do doce aleitamento materno

santo padre das induções
melancólico de ardentes desejos
evita novas conversões...

perseguido e escondido
sai da representação
pra comoção em ação
agitador de orgias femininas...

 

Luiza Silva Oliveira 



Com Os Dentes Cravados Na Memória

 

A Mocidade Independente de Padre Olivácio – A Escola de Samba Oculta No Inconsciente Coletivo, nasceu em dezemvro de 1990, durante uma viagem em que cia de Guiomar Valdez, levamos uma turma de estudantes da então ETFC(IFF), a Ouro Preto-MG, como premiação por terem vencidos a Gincana Cultural desenvolvida durante o ano, pelo Grêmio Estudantil Nilo Peçanha. Lá conheci Gigi Mocidade – A Rainha da Bateria, com quem vivi até 1996.

 

A Igreja Universal do Reino de Zeus, criei em 2002 durante a 1ª Bienal do Livro de Campos dos Goytacazes-RJ, que foi realizada nas dependências do Ginásio de Esportes do então CEFET-Campos, onde na ocasião lancei o livro BraziLírica Pereira : A Traição das Metáforas.

O grande objetivo da IURZ é homenagear deuses deusas da África e Grécia para de alguma forma descobrir de onde vem as nossas ancestralidades. De alguma forma e em alguns momentos mitologia grega e africana se misturam e viajando metaforicamente nessas realidades reinventadas vim desaguar no Vampiro Goytacá canibal Tupiniquim.

 

Artur Gomes

https://arturgumes.blogspot.com/


URGENTEMENTE.


É urgente o amor
É urgente um barco no mar

É urgente destruir certas palavras,
ódio, solidão e crueldade,
alguns lamentos, muitas espadas.

É urgente inventar alegria,
multiplicar os beijos, as searas,
é urgente descobrir rosas e rios
e manhãs claras.

Cai o silêncio nos ombros e a luz
impura, até doer.
É urgente o amor, é urgente
permanecer.

Eugénio de Andrade,
in "Até Amanhã"

foto: o canto da natureza


Série: Fábulas Contemporâneas
Livro: Risca Faca
(Ademir Assunção)


Soneto Da Separação

"De repente do riso fez-se o pranto
Silencioso e branco como a bruma
E das bocas unidas fez-se a espuma
E das mãos espalmadas fez-se o espanto


De repente da calma fez-se o vento
Que dos olhos desfez a última chama
E da paixão fez-se o pressentimento
E do momento imóvel fez-se o drama


De repente, não mais que de repente
Fez-se de triste o que se fez amante
E de sozinho o que se fez contente


Fez-se do amigo próximo, o distante
Fez-se da vida uma aventura errante
De repente, não mais que de repente."

Vinícius de Moraes


Poema de Antonio Gamoneda, crítico de arte e poeta espanhol, vencedor do Prêmio Cervantes de 2006. Está com 92 anos de idade. Tradução de Luís Avelima.

Incandescência e ruínas


I

Eu invoco a cabeça
mais sagrada que exista
sob a neve.

Meu coração azul
canta purificado pelo silêncio.

II

Vândalo de pureza,
fustiga-me. Se falas,
baixarei meus lábios
até a água selvagem.
Daquela gruta onde
abrasa a frescura,
há de surgir um rei
sujo de profecias.

Oh coração que vês
em toda escuridão,
quando estaremos cegos
na luz, quando falarás,
habitante do fogo.

III

Um cão milagroso
come em meu coração.
Cerimônia selvagem:
minha dor se incorpora
ao cão apaixonado.

IV

Na cavidade que conheces,
soa uma voz. Língua fria,
tu, que assobias na noite,
metal vivo de palavras,
dizei-me, louco rouxinol
do inverno, dizei-me, tu,
que talvez participas
de uma matéria luminosa,
a quem anuncias agora
a não ser a morte.

V

Anticanto de amor,
quem te beberá, quem
colocará a boca nesta
espuma proibida.

Quem, que deus, que
enlouquecidas asas
poderão vir, amar
aqui.
Onde não há nada.


SENTENÇA

faz muito tempo que eu venho
nos currais deste comício,
dando mingau de farinha
pra mesma dor que me alinha
ao lamaçal do hospício.


e quem me cansa as canelas
é que me rouba a cadeira,
eu sou quem pula a traseira
e ainda paga a passagem,
eu sou um número ímpar
só pra sobrar na contagem.


por outro lado, em meu corpo,
há uma parte que insiste,
feito um caju que apodrece
mas a castanha resiste,
eu tenho os olhos na espreita
e os bolsos cheios de pedras,
eu sou quem não se conforma
com a sentença ou desfeita,
eu sou quem bagunça a norma,
eu sou quem morre e não deita.

Salgado Maranhão

Do livro: A Cor da Palavra
Prêmio da Academia Brasileira de Letras - 2011





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