terça-feira, 23 de agosto de 2022

Coletânea Poetas Vivos

 


UNS E OUTROS

Depois de agosto
quero uma primavera de andar sobre a relva
há que sobrar uma flor a se abrir em amor
estou farta dessas farpas
em palavras nunca ditas
navalhas afiadas cortando a língua
ao revés da lavra
quero livre a dor
quero leve a cor
tempestades são anunciadas
busco um gesto equilibrista
entre ventos tão revoltos
nesse quase mundo malabarista
deixo solta a asa
- eu briso
no vendaval da vida -

(Nic Cardeal/2020)


o ruído

 

o ruído é mudo.

ouço o seu silêncio espalhafatoso.

o ruído delira na sua mais infinita

horda de desespero noturno.

tudo o que for espaço

do qual ele não caiba,

ele grita para os moucos,

ele circula no quadrado,

ele busca a inércia dos santos,

ele imerge no mênstruo das virgens.

o ruído gargalha sequioso,

divaga fora do tempo.

 

Dudu Galisa


jura não secreta

 

naquele mar de música

toda meta física

pela tarde quântica

comunhão e prece

no sentido oculto

de mergulhar na pele

dos teus olhos raros

que o poema tece

como um rio claro

         onde navegar

 

Artur Fulinaíma

https://arturkabrunco.blogspot.com/




toada

 

a mãe sentia enjoança

nos dias tais

o pai lavava os pés

e as partes

dizia ser justo

a mãe temia outra cria

não por desamor

que lambia todas elas

os de barriga crescida

de pele amarela

os de dentes ruins

e os de corpo ligeiro

nas ajudas nas feiras

tanta precisão...

também não gostava mais

do homem entre as pernas

sem paciência

ou palavra bonita

só o bruto esgueirando

o refúgio árido

a mãe fazia maria isabel

sem luxo de carne seca

pimentão

farinha pimenta e cebola

era bom

mesmo grudando na boca

na garganta

pedindo água pra passagem

a mãe gostava de ver

a lambuzança dos meninos

as risadinhas de alegria

da fome esquecida

a mãe amarrava lenço na cabeça

e pegava a enxada

nos tempos de verde

deitava olho comprido

nas gentes

todo dia escuro

no batente da porta

esburacada

tinha medo que um bicho

fosse fazer pouso por lá

e achasse boa aquela ossura

os de tamanho e de força

pra roçar iam atrás

chutando pedra e terra

gritando gol

sonhando com bebida

de canudinho

o pai dava peteleco

que não gostava de bestagem

a mãe apertava o peito

e os olhos secos

mais seco que aquele sertão

e xingava padim ciço

que não valia

por suas crianças

e mandava mais

e mais e mais

o menor parido leso

a mãe pegou estrada tísica

o sol queimava a cabeça

os cabelos caindo

sem laço

que tanto gostava

o pai até ficou manso

ajudava o passo pouco

molhava os lábios feridos

prometia mesa cheia

escola roupa limpa

baile e vestido de flor

depois enervava

e punha ligeireza

nas pernas

tocando a família

como se fosse boiada

lembrança dos tempos do avô

em cima de um cavalo

pé duro

... como a vida

 

Mara Magaña

 Imagem: Livre versão sobre obra de Damião Martins de Castro



                                            Ronaldo Zacharias 


poema da criação


no primeiro dia da criação

eu era o último da fila

nasci de improviso

deus estava em crise

minha alma é um lago à tarde

não sei chorar pra fora

vejo as estrelas

meu desalento dorme

e se encontra com o desespero

no primeiro lugar da fila

no último dia da criação

 

Jovino Machado

 

 

Quando a dor era muita
Pintava um maço de callas

Na tela
Muda

No mata-borrão
O desabafo.

Manuela Dipp

Poema escrito para o exercício do Sarau da Invencionática com inspiração na obra de Magliani

🎨 aquarela de Maria Lídia Magliani
📷 Arquivo pessoal de Paulo Gasparotto: "Noutra ocasião, descobri que existem flores negras e levei um arbusto florido para minha casa. Naquele dia, Magliani esteve me visitando e mostrei as originais flores. Em seguida, recebi o desenho aquarelado com as flores que me encantavam".







Com quantos silêncios

 Se faz uma metáfora?

Com quantas palavras

Se escreve poesia?

o coelhinho no colo

é para esconder o seu desejo

 

Federico Baudelaire

 

os sonhos estão escassos

no caminho de quem
vive e sente

tudo é mudez e silêncio
na vida do indigente
sem sobras nem sorte

sem eira nem beira
aos trancos e barrancos
sem amparo nem nome

as cabeças não se voltam
seus olhos estão voltados
em outra direção

e a miséria
não ocupa seu tempo
que vale ouro

Poema de Benette Bacellar - 2022
WERON fotoportrecista FX 


                                  

                                   inverno

primeiro sonho

I

era agosto
e vimos o centro do Rio pegar fogo
enquanto procurávamos algum lugar
que vendesse o nosso café coado

era agosto
e você contava pela milésima vez
sobre a performance da Lygia Clark
e eu fingia que era a primeira
só para você repetir pela milésima vez
aquele gesto com as mãos que eu tanto amava

era agosto
e era preciso alimentar certas coincidências
e era preciso alimentar certas ilusões
e todo o “sim” que as placas diziam
mesmo quando a cidade cantava:

♪ Vai passar…

 

Lisa Alves

Leia mais na vista Acrobata

https://revistaacrobata.com.br/demetrios/poesia/4-poemas-de-lisa-alves/?fbclid=IwAR3AKxp16bLhiGN9uXcDzzD65QStJHSqHh-SBdeEtjZdeAxRUv1sMEqxVxo



 Jura secreta 57

                         meta metáfora no poema meta

como alcançá-la plena
no impulso onde universo pulsa
no poema onde estico prumo
onde o nervo da palavra cresce
onde a linha que separa a pele
é o tecido que o teu corpo veste

como alcançá-la pluma
nessa teia que aranha tece
entre um beijo outro no mamilo
onde aquilo que a pele em prumo
rompe a linha do sentido e cresce
onde o nervo da palavra sobe
o tecido do teu corpo desce
onde a teia que o alcançar descobre
no sentido que o poema é prece

 

Artur Gomes

do livro Juras Secretas

Editora Penaluz – 2018

Leia mais no blog  https://secretasjuras.blogspot.com/




"estão terrivelmente sozinhos/ os doidos, 

os tristes, os poetas"


                                    Hilda Hilst




Ariano

Aos nascidos entre 21/3 e 19/4

Se amo
me inflamo
Se odeio
incendeio
Tudo, em mim,
chama chama
sem rodeio.

Leonardo Almeida Filho


Agosto

 

vento a gosto

cachorro louco

solto

no entre posto

          confusão

em sacramento

no poema desatino

quando escrevo e não assino

 

Artur Gomes Fulinaíma

 

leia mais no blog

https://fulinaimagens.blogspot.com/




Geleia Geral – Revirando A Tropicália

Terceira Edição – Especial em comemoração a chegada dos 74 anos do poeta Artur Gomes

Santa Paciência – Casa Criativa – Rua Barão de Miracema, 81 – Campos ex-dos Goytacazes-RJ

E vem aí Pátria A(r)mada – segunda edição revista e ampliada – Editora Desconcertos – lançamento em setembro próximo

veja toda programação no blog

https://centrodeartefulinaima.blogspot.com/

foto: Welliton Rangel



Fulinaíma MultiProjetos

fulinaima@gmail.com 

22 – 99815-1268 - whatsapp

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Live em homenagem a Antônio Cícero

No próximo dia 23 às 16:hs à convite da minha amiga  Renata Barcellos BarcellArtes  estaremos nessa live em homenagem a memória de  Antônio ...